- Author, Sara Monetta
- Role, Da BBC em Jerusalém
21 outubro 2023, 12:20 -03
Atualizado Há 5 minutos
Dezenas de cidadãos árabes de Israel foram presos por causa de postagens feitas nas redes sociais sobre a guerra em Gaza.
Entre eles está uma conhecida cantora e influenciadora de Nazaré, Dalal Abu Amneh, que ficou detida sob custódia policial por dois dias antes de ser libertada sob fiança na quarta-feira (18/10). Agora ela está em prisão domiciliar até segunda-feira (23/10).
Segundo sua advogada, Abeer Baker, ela foi acusada de "comportamento perturbador" por agentes da polícia, que afirmaram que as suas publicações poderiam incitar à violência entre os seus seguidores.
O post que chamou a atenção da polícia foi uma imagem da bandeira palestina com um texto em árabe que diz: "Não há vencedor senão Deus".
Baker diz que a cantora, que é bem conhecida em todo o mundo árabe pelas suas canções sobre a cultura palestina, estava expressando um sentimento religioso. As autoridades israelenses interpretaram a postagem da cantora como uma incitação aos palestinos para pegarem em armas.
Desde o início da guerra entre Israel e o Hamas, a polícia israelense adotou o que chama de "política de tolerância zero" em relação às atividades nas redes sociais consideradas como expressão de apoio ao Hamas — grupo islâmico que prega a destruição de Israel e designado como organização terrorista por Israel, EUA, Reino Unido e muitos outros países.
Abu Amneh é uma das dezenas de cidadãos árabes de Israel presos em conexão com postagens nas redes sociais sobre a guerra.
Muitos outros foram suspensos ou despedidos dos seus empregos ou enfrentam ações disciplinares por parte das suas universidades.
Os árabes israelenses – muitos dos quais preferem ser chamados de cidadãos palestinos de Israel — constituem um quinto da população do país.
Desde o ataque do Hamas, a polícia afirma ter investigado e detido mais de 100 pessoas pelas suas atividades nas redes sociais. Só em Jerusalém, 63 foram presos e interrogados.
"Qualquer pessoa que incite [violência] contra o Estado de Israel, os seus símbolos governamentais, funcionários eleitos, pessoal militar e polícia, deve estar ciente de que a polícia de Israel responderá com firmeza e sem leniência", disse o Comissário da Polícia de Israel, Yaakov Shabtai, esta semana.
O Centro Legal para os Direitos das Minorias Árabes em Israel (Adalah) acredita que o número de detidos é maior, já que mais prisões foram feitas recentemente.
Em comparação, durante o conflito Israel-Gaza, em maio de 2021, apenas 16 pessoas — 15 das quais eram árabes — haviam sido acusadas de incitação à violência, de acordo com um relatório divulgado pela Adalah.
Os ativistas dos direitos humanos temem que este aumento nas prisões se deva ao fato de a polícia adoptar uma interpretação ampla do que constitui incitamento à violência.
Na cidade beduína de Rahat, por exemplo, a polícia deteve um antigo candidato a presidente da Câmara, Amer al-Huzail, que compartilhou nas redes sociais um mapa da Faixa de Gaza com uma análise de possíveis cenários para uma esperada operação terrestre das forças israelenses.
Isso o levou a ser acusado de ajudar o inimigo em tempos de guerra.
Mas mesmo quando não são apresentadas acusações criminais, algumas pessoas em Israel ainda enfrentam fortes consequências pelas suas atividades nas redes sociais.
Os advogados que trabalham para Adalah dizem ter recebido mais de 40 casos de trabalhadores árabes israelenses suspensos ou demitidos de seus locais de trabalho.
"Às vezes, as pessoas veem o seu sustento ameaçado apenas por curtirem uma publicação", diz Salam Irsheid, advogado da organização. "Temos até o caso de um trabalhador que corre o risco de ser demitido por curtir uma reportagem sobre a situação em Gaza nas redes sociais."
Os estudantes árabes em Israel também enfrentam ações disciplinares por parte das suas universidades.
Na semana passada, Ariel Porat, presidente da Universidade de Tel Aviv, disse que alguns estudantes foram denunciados por expressarem "apoio às atrocidades do Hamas".
"Seremos muito rigorosos com este punhado de estudantes", escreveu ele num comunicado no site da universidade, "e quando sentirmos que a ofensa for de natureza criminosa. Nós iremos denunciá-los à polícia nesta situação delicada, mas não negarenos a nenhum estudante o direito a uma investigação justa".
Os advogados de Adalah afirmam ter recebido queixas de 83 estudantes que foram suspensos das instituições de ensino em todo o país e, em alguns casos, instruídos a abandonar as suas acomodações a curto prazo.
"Nenhum dos casos é sobre ações, manifestações ou participação em atividades ilegais. São todos sobre publicações nas redes sociais", diz Hassan Jabareen, diretor-geral da Adalah.
"Mais de 90% dos posts são claramente contra a guerra, contra as ações de Israel em Gaza, apoiando as vítimas da guerra em Gaza", acrescenta.
"Dez por cento dos postos situam-se numa área vaga que pode ser interpretada como apoio indireto aos atos do Hamas contra civis. Em tempos normais, eles não seriam interpretados dessa forma, mas hoje em dia Israel tende a dar a interpretação mais dura a esses posts."
Vozes judaicas israelenses que fazem apelos contra a violência também estão sendo alvos de indignação de parte do público.
No domingo passado, um famoso jornalista judeu ultraortodoxo de esquerda, Israel Frey, teve de ser escoltado pela polícia em Tel Aviv para sua própria proteção.
Os manifestantes se reuniram do lado de fora do prédio onde ele mora e dispararam fogos de artifício contra seu apartamento depois que ele postou nas redes sociais um vídeo em que orava pelos civis em Gaza.
E na quarta-feira, Ofer Cassif, um parlamentar judeu da aliança Hadash-Taal liderada pelos árabes, foi suspenso do parlamento israelense por 45 dias depois de ter condenado veementemente o bombardeamento de Gaza.
Em uma das suas publicações mais recentes no X, anteriormente conhecido como Twitter, ele criticou a polícia que, segundo ele, não interveio prontamente em defesa de Frey.
"As forças policiais armadas são enviadas para prender qualquer pessoa que demonstre um traço de empatia pelos massacres em Gaza", escreveu ele.
"Mas a polícia não tem vontade alguma de proteger um jornalista de esquerda cuja vida está em perigo."
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