Sara al-Saqqa e seus colegas do hospital Al-Shifa posam para selfie

Crédito, Sara al-Saqqa

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Sara al-Saqqa com seus colegas em Gaza

  • Author, Mary O’Reilly e Haya Al Badarneh
  • Role, BBC 100 Women
  • Há 14 minutos

Quando se formou em agosto, a palestina Sara al Saqqa, 31 anos, fez história ao se tornar a primeira cirurgiã a se formar na Faixa de Gaza.

"Tinha muitas ambições e ideias sobre como melhorar os cuidados de saúde", diz ela, que esperava um dia abrir sua própria clínica.

Mas, oito semanas depois, seu único desejo era de que a sua família sobrevivesse aos ataques de Israel.

"As prioridades de todos mudaram e agora só pensamos em permanecer vivos".

Sara trabalhou no maior hospital de Gaza, Al Shifa, no norte do território, desde que se formou.

No dia 7 de outubro, ela estava de folga e se lembra de ver sua irmã mais nova, de 17 anos, se arrumando para ir para a escola.

"Mas começamos a ouvir bombardeios e não a deixamos ir", diz ela.

Desde então, os ataques aéreos e as invasões terrestres de Israel reduziram grande parte de Gaza a escombros, matando 20 mil pessoas, segundo o Ministério da Saúde controlado pelo Hamas.

Sara foi imediatamente convocada para trabalhar.

Ao chegar, viu "um massacre, com uma avalanche de feridos", conta.

Caos no Hospital Al-Shifa

Crédito, Getty Images

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Hospital Al Shifa recebeu centenas de feridos de ataques israelenses

Desde o início, os funcionários ficaram impressionados com o grande número de pessoas "com membros amputados por estilhaços e diversos tipos de lesões causadas por queimaduras intensas".

Quando Israel iniciou os seus ataques aéreos, pediu que os habitantes de Gaza evacuassem a parte norte do enclave e se deslocassem para o sul, sob a alegação de que lá estariam mais seguros.

Mas Sara decidiu ficar.

"Trabalhamos sem parar por mais de 34 dias; não podíamos voltar para casa", conta.

Ele descreve para a BBC como as condições pioraram rapidamente: "Depois de cada bombardeio, centenas de pacientes chegavam ao mesmo tempo e era impossível cuidar de todos eles".

Selfie de Sarah al Saqqa

Crédito, Sarah Al-Saqqa

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Sarah al Saqqa trabalhou 34 dias sem descanso até ter que deixar hospital para sua segurança

Muitos procuraram segurança nas dependências do hospital.

As pessoas lotavam todos os espaços disponíveis, assavam pão nos corredores, dormiam no chão e nos armários e tentavam distrair os filhos com brincadeiras.

O hospital estava com dificuldades para conseguir suprimentos básicos, como medicamentos e luvas esterilizadas, e Sara teve que decidir quais pacientes priorizar com base nas chances de sobrevivência.

'Desamparada'

"Me senti horrível. Fiquei completamente desamparada", diz ela. "Fiz o melhor que pude com o pouco que tínhamos para tratar os pacientes. Fiquei arrasada por não ter conseguido salvar tantas vidas inocentes."

No entanto, houve momentos de esperança.

Sara ajudou a dar à luz um bebê pela primeira vez depois que ela e a mãe ficaram presas uma noite na sala de cirurgia enquanto bombas caíam do lado de fora.

Sara tentou desesperadamente chamar um ginecologista para ajudá-la, mas ninguém apareceu.

Às 6h já não podia esperar mais. "Pedi a Deus para me ajudar e salvar a mãe e a menina", diz ela.

O bebê nasceu com o cordão umbilical enrolado no pescoço, mas Sara conseguiu retirá-lo e trouxe a menina ao mundo com segurança.

Grata, a mãe deu o nome de Sara para a filha.

O bebê recém-nascido

Crédito, Sarah Al-Saqqa

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Mãe de bebê salva por Sara deu nome dela para filha

Um dos maiores desafios para Sara foi quando as comunicações foram cortadas. Ela parou de receber notícias de sua mãe, de seus quatro irmãos e de sua avó.

Quando isso aconteceu, a família se dirigia para Rafah, no sul de Gaza, e Sara não sabia se estavam vivos ou mortos: "Eu não conseguia funcionar, não conseguia fazer nada".

Sara conta que estava com medo de que eles se encontrassem em um lugar bombardeado.

'Pior fase da minha vida'

Mas, à medida que o conflito aumentava, os desafios de Sara se multiplicaram.

Os suprimentos de comida e água acabaram e "durante a última semana não houve eletricidade... sobrevivemos com o mínimo".

Algo tão singelo como receber um pedaço de pão se tornou um momento de alegria.

Quando as luzes se apagaram, ela teve que percorrer os corredores lotados do hospital à luz de velas e realizar cirurgias quase na escuridão, com o som de bombas ao seu redor.

"Descreveria esse período como o pior da minha vida. Vivi um inferno", diz.

Pessoas dormindo nos corredores

Crédito, Getty Images

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Durante ataques israelenses, pessoas buscaram segurança no hospital Al Shifa

Quando as bombas se aproximaram do hospital e ficou claro que o Exército israelense estava prestes a invadir o local, Sara temeu morrer se ali permanecesse, então decidiu deixar tudo para trás e também seguir para Rafah para ficar junto de sua família, que agora está abrigada na casa do tio dela.

No entanto, a médica não fez a viagem para o sul sozinha. Caminhou com os colegas e com a mãe e o bebê que ajudou a trazer ao mundo.

Quando o Exército israelense invadiu o hospital, as autoridades israelenses afirmaram que se tratava de uma "operação direcionada contra o Hamas" e alegaram que haviam encontrado no local um "centro de operações", algo que o Hamas negou.

Sem água ou comida

Ao descrever a sua vida e a onda de mais de 1 milhão de deslocados de Gaza, Sara diz: "Não temos água para beber nem comida para colocar na boca. Escolas, praças. O inverno chegou e não estamos preparados, não temos roupas, nem cobertores, nem nada."

Ela ainda está tentando usar seu treinamento médico quando pode.

"Todos os dias saímos e ajudamos no que podemos porque os abrigos e as escolas precisam de nós".

Sara diz estar preocupada com o que o futuro reserva para ela e sua família.

"Este ano deveria ser o último ano de escola da minha irmã antes de ela se formar e começar sua vida, mas agora não temos ideia do que vai acontecer."

Tal como outros moradores de Gaza, suas esperanças e sonhos deram lugar à luta pela própria sobrevivência.