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De ventilador a jatos: como GE tornou Petrópolis polo global da aviação

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De ventiladores a jatos

 Instalações hoje são responsáveis pelo maior centro de manutenção de motores aeronáuticos do hemisfério sul
Ventilador fabricado na antiga Companhia Eletromecânica Celma, em Petrópolis (RJ): Instalações hoje são responsáveis pelo maior centro de manutenção de motores aeronáuticos do hemisfério sul Imagem: Divulgação

A origem da GE Celma remonta a 1951, quando foi criada em Petrópolis (RJ) como Companhia Eletromecânica Celma. Inicialmente, seu foco era a fabricação de eletrodomésticos, como ventiladores e liquidificadores.

Poucos anos depois, a empresa foi adquirida pela Panair do Brasil, então uma das principais companhias aéreas do país. Com isso, a Celma passou a atuar na manutenção de motores aeronáuticos, tornando-se uma das pioneiras na atividade.

Com o golpe militar de 1964, a Panair teve suas operações interrompidas pelo governo, e a Celma foi incorporada pelo Estado e quase teve suas atividades encerradas. Foi por decisão direta do então ministro da Aeronáutica, brigadeiro Eduardo Gomes, que a empresa foi mantida em funcionamento, já que a manutenção de motores foi vista como questão estratégica para a soberania nacional.

Em uma visita à fábrica, o militar, que tinha uma casa em Petrópolis, ficou admirado com o potencial do local. Como era sábado de Carnaval, não encontrou ninguém, mas escreveu em uma lousa usada na zona de produção a frase "A Celma continuará revisando", deixando o recado claro de que o local era importante para a estratégia do governo.

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 Ao centro, mensagem do brigadeiro Eduardo Gomes dizendo "A Celma continuará revisando"
Placas alusivas à história da GE Celma: Ao centro, mensagem do brigadeiro Eduardo Gomes dizendo "A Celma continuará revisando" Imagem: Divulgação/GE Aerospace

O item está preservado até hoje nas instalações da empresa em Petrópolis, ao lado de outro painel onde está escrito "Another 60 years" (outros 60 anos), uma homenagem de Jeff Immelt, então diretor-executivo da General Electric, aos 60 anos da empresa, completados em 2011.

Após a decisão tomada durante a ditadura, a Celma permaneceu sob controle estatal até a década de 1990, quando foi incluída no programa de privatizações do governo federal. Em 1991, foi adquirida por um consórcio privado liderado pela Andrade Gutierrez.

Em 1996, a norte-americana GE assumiu o controle da empresa, dando início a uma fase de forte expansão. Em 1998, foi criada a joint venture GE Varig Engine Services, com 95% de participação da GE e 5% da companhia aérea. Hoje, a GE Aerospace é a única acionista da empresa.

A maior do hemisfério sul

 Local é considerado o maior e mais moderno banco de provas do mundo da empresa
Motor GEnx na GE Celma em Três Rios (RJ): Local é considerado o maior e mais moderno banco de provas do mundo da empresa Imagem: Alexandre Saconi
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Hoje, a GE Celma é a maior empresa de manutenção, reparação e revisão (MRO) de motores aeronáuticos do hemisfério sul. Com cinco unidades operacionais, a companhia tem capacidade prevista para revisar 630 motores neste ano, sendo que 90% de todos os reparos das peças e dos componentes dos motores que estão na empresa são feitos dentro da própria Celma.

Em 2024, a empresa anunciou um novo investimento de R$ 430 milhões para ampliar sua capacidade produtiva na unidade de Três Rios. O objetivo é atender principalmente a demanda por motores da nova geração Leap.

A GE Celma emprega cerca de 2.800 funcionários diretos e 700 terceirizados. Com os novos investimentos, a expectativa é que esse número chegue a 4.500 até o fim da década, para conseguir atingir a marca de 800 a 900 motores revisados por ano.

 Produto foi desenvolvido pela própria empresa, e consegue limpar até mesmo a poeira fina do deserto de motores que voam na região do Oriente Médio
Equipamento de limpeza dos motores na GE Celma: Produto foi desenvolvido pela própria empresa, e consegue limpar até mesmo a poeira fina do deserto de motores que voam na região do Oriente Médio Imagem: Alexandre Saconi

A empresa também se destaca pelas parcerias com instituições de formação técnica, como o Senai. Jovens aprendizes atuam em diversas áreas da operação, e cerca de 80% deles são posteriormente efetivados. Ao final do curso, os alunos estão aptos a prestar a prova da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) para obterem a autorização para atuarem como mecânicos aeronáuticos.

Esse é um passo importante para a empresa, que acredita que sua expansão só será possível com o aumento de profissionais qualificados no mercado. Com isso, a GE Aerospace Foundation fez uma doação de US$ 150 mil para melhorias na estrutura de ensino do Senai da região.

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Certificada pelas principais agências reguladoras do mundo (Anac, FAA e Easa), a GE Celma é responsável pela manutenção de motores utilizados por companhias aéreas da América Latina, Europa, Oriente Médio e Ásia.

Entre os modelos revisados estão motores como o CF6, CF34, GEnx, CFM56 e o mais recente Leap, usados por jatos comerciais de médio e grande porte de Airbus, Boeing e Comac, por exemplo. A manutenção inclui desmontagem completa, análise técnica, reparos e testes finais.

Representação do motor GEnx, mesmo que passa por manutenção nas unidades da GE Celma no Rio de Janeiro
Representação do motor GEnx, mesmo que passa por manutenção nas unidades da GE Celma no Rio de Janeiro Imagem: Divulgação/GE Aerospace

Momentos críticos

Apesar do sucesso atual, a empresa enfrentou momentos difíceis. Um dos mais graves ocorreu após os ataques de 11 de setembro de 2001. Com a crise global da aviação, a demanda por manutenção despencou, e a GE Celma precisou fazer uma demissão em massa. Centenas de trabalhadores foram desligados.

Nos anos seguintes, a empresa conseguiu se reerguer com a ampliação da clientela internacional que, hoje, representa 95% dos serviços GE Celma. A recuperação econômica e a renovação de frotas ajudaram a retomar os volumes de serviços.

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Hoje, a memória desse período ainda é lembrada internamente como um alerta sobre a importância de diversificar mercados e manter eficiência operacional.

Onde fica cada unidade

A GE Celma opera cinco unidades no estado do Rio de Janeiro. Três delas estão em Petrópolis, onde se concentram as áreas administrativas e parte da manutenção.

A unidade de Três Rios é responsável por etapas mais pesadas da manutenção, como desmontagem e inspeções estruturais. Ela está em expansão e será a principal base dos motores Leap.

Em 2024, a GE Aerospace anunciou investimento de R$ 430 milhões para ampliar sua capacidade produtiva na unidade de Três Rios (RJ) para atender à crescente demanda de motores Leap
Em 2024, a GE Aerospace anunciou investimento de R$ 430 milhões para ampliar sua capacidade produtiva na unidade de Três Rios (RJ) para atender à crescente demanda de motores Leap Imagem: Alexandre Saconi

No Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio, a empresa possui uma unidade dedicada ao ensaio de motores em funcionamento. O local conta com banco de provas onde os motores são testados em condições reais de operação.

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Essa estrutura distribuída permite que a empresa atenda a diferentes etapas do processo com eficiência e rapidez. A logística é planejada para reduzir o tempo total de permanência de cada motor.

Como é feita a manutenção?

Motor de avião em manutenção na unidade de Três Rios (RJ) da GE Celma
Motor de avião em manutenção na unidade de Três Rios (RJ) da GE Celma Imagem: Alexandre Saconi

Quando um motor chega à GE Celma, ele passa por uma triagem e segue para o chamado Gate 1, onde ocorre a desmontagem completa. Cada componente é inspecionado e classificado quanto à necessidade de reparo ou substituição.

Na sequência, os componentes passam por limpeza, testes não destrutivos, soldagens, aplicação de revestimentos e usinagens, dependendo do dano identificado. Esse processo ocorre nos Gates 2 e 3.

Na etapa final, o motor é remontado e segue para testes em bancada, no Gate 4. Só depois de aprovado em todos os parâmetros ele é liberado para entrega ao cliente.

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Esse processo pode levar entre 45 e 90 dias, dependendo do modelo do motor e da complexidade dos reparos. O foco é garantir que ele volte a operar com desempenho igual ou superior ao original.

Mesmo que uma empresa envie o motor apenas para um tipo de reparo, é responsabilidade técnica da GE Celma analisar todas as partes dele antes de liberar de volta ao proprietário. Caso alguma não esteja de acordo com os padrões de segurança, o contratante é avisado para decidir como deverá ser realizada a manutenção antes de liberar o motor para voar novamente.

Banco de provas

Os motores são testados em prédios dedicados para essa missão. Eles ficam pendurados em estruturas gigantescas, como no banco de provas de Três Rios, onde ficam presos a 10 metros de altura do chão.

Após todo o processo de manutenção, eles são levados para um galpão de cerca de 1.200 metros quadrados e ligados a diversos sensores e sistemas de abastecimento. Proteções são colocadas no entorno do motor, e uma entrada de ar é adaptada para que o fluxo de ar seja otimizado.

A partir desse momento, a sala onde o motor está é fechada e os testes começam. O ar movimentado flui por um enorme duto com seis metros de diâmetro por 36 metros de profundidade, mostrando o tamanho da infraestrutura.

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Banco de provas na GE Celma em Petrópolis (RJ)
Banco de provas na GE Celma em Petrópolis (RJ) Imagem: Alexandre Saconi

Durante a operação, ninguém pode ficar na área, tanto pelo barulho quanto pelo risco de ser sugado para dentro do motor. Se os parâmetros estiverem em ordem, o motor segue para a liberação. Caso não, volta à linha de manutenção até estar de acordo com os parâmetros operacionais desejados.

Internacionalização

Algumas bandeiras de países de origem dos motores que passam por manutenção na GE Celma, em Petrópolis
Algumas bandeiras de países de origem dos motores que passam por manutenção na GE Celma, em Petrópolis Imagem: Alexandre Saconi

Grande parte dos clientes da empresa são grandes empresas internacionais. Entre elas, se destacam a American Airlines, United Airlines, Atlas Cargo e a Ryanair, empresa europeia que não opera no Brasil.

Os motores chegam ao Rio de Janeiro em navios ou como carga aérea, onde é feito uma importação temporária, que é válida apenas para a realização da manutenção. Esse regime tributário diferenciado permite uma maior economia das empresas, já que não é preciso ser feita a importação e exportação do item, já que ele está no Brasil apenas para ser consertado.

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A empresa também se especializou na manutenção de aviões que voam em diferentes locais do mundo, como nas regiões desérticas do Oriente Médio. Um equipamento especial de limpeza dos motores foi desenvolvido pela própria GE para retirar impurezas e sujeiras dos motores que irão passar pelo conserto, inclusive as areias finas do deserto daquela região, que impregnam as peças com o tempo.

Unidade 14 Bis da GE Celma, em Nova Petrópolis (RJ)
Unidade 14 Bis da GE Celma, em Nova Petrópolis (RJ) Imagem: Divulgação/GE Aerospace
Unidade de Três Rios da GE Celma, do grupo GE Aerospace, no Rio de Janeiro
Unidade de Três Rios da GE Celma, do grupo GE Aerospace, no Rio de Janeiro Imagem: Divulgação/Marcos Lara/GE Aerospace

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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