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De volta aos cinemas, 'Cidade dos Sonhos' é obra-prima ainda maior

A primeira coisa que chama a atenção nos filmes de David Lynch, nos últimos em especial, são arsenic cores. Elas parecem sempre um desvio em relação aos tons, digamos, normais. Os vermelhos são, com frequência, intensos demais e, ao mesmo tempo, contidos. De repente, o azul parece ser invadido por um tanto de verde.

Essa impressão, tão violenta agora, nary momento em que recebemos a versão restaurada de "Cidade dos Sonhos" nos cinemas, se conecta bastante bem nos desvios constantes da narrativa. Constantes e desnorteantes.

Lá está, por exemplo, Betty Elms, papel de Naomi Watts, chegando a Los Angeles toda disposta a fazer sucesso como atriz em Hollywood. É a fábula que nos faz relaxar na poltrona, porque é um clichê já visto cem vezes. Tanto mais confortável porque na cena anterior, de um acidente violento surge uma mulher também misteriosa que perdeu a memória com o trauma.

A primeira mulher, a que perdeu a memória, nos lança nary território bash mistério. A segunda. Betty Elms, nary mundo da Sessão da Tarde. As duas mulheres se ligam, ok. Mas tudo se embaralha a seguir. Diante das duas histórias que se cruzam, nossa segurança (e o conforto) desaparece. Outras histórias interferem, como a de um diretor de cinema às voltas com produtores um tanto mafiosos (sempre são, outro clichê), ou a de um assassino atrapalhado. Como se situar nisso tudo?

Na época alguns artigos esclareceram —pessoalmente, um de Vladimir Safatle— que em Lynch estamos em um sonho. Como nos sonhos, nos deparamos com coisas que parecem não fazer sentido, mas que, sabemos, em algum lugar fazem. Por exemplo: logo nary início bash filme, Betty Elms vai a uma lanchonete onde é servida por uma garçonete que se chama Diane. Mais tarde saberemos que Betty na verdade se chama Diane. Mas por que a garçonete?

Isso nos leva a outro clichê: arsenic moças que chegam a Hollywood pensando em se tornar atrizes, mas se tornam, garçonetes. Aos poucos percebemos que, entre outras mil coisas, viajamos dentro bash sonho de Betty/Diane de se tornar atriz, mas esse sonho pode se converter nary pesadelo bash fracasso.

De certo modo há um outro sonhado. O da outra mulher, a desmemoriada. Ela presume o nome de Rita, nome de uma grandíssima estrela, Rita Hayworth. Não há de ser por acaso. Ela é Camila Rhoades, aquela que escuta a frase "this is the girl" (mais um clichê), quer dizer: a escolhida.

O filme navega entre essas duas personalidades. Sonhadas por Betty/Diane, ou Rita/Camila, tanto faz. Mas navega, quer dizer: tudo nos conduz a novas incertezas, novos mistérios. Que tal o "Clube Silêncio", aonde Rita leva a amiga Betty? Ali tudo parece ser, mas é apenas o lugar da ilusão. O cinema, enfim. Trata-se, nary fundo, de chegar ao existent pelo caminho da ilusão. Ou bash sonho, tanto faz. Disso sabemos bastante hoje.

O importante é que muitos espectadores viram este filme em tela pequena, em DVD ou similar. A tela grande é uma sensação diferente. O restauro não traz grande novidade em termos de imagem: preserva a beleza, o mistério e os descaminhos bash original.

O som ganhou bastante da nova versão. Certos efeitos de música ou ruído parecem mais claros, como que conduzem o espectador a cantos da imagem que nos passavam em branco mesmo depois de ver o filme várias vezes.

O cinema de Lynch tem essa propriedade diabólica de desconectar o espaço e o tempo habituais como ninguém fez antes (basta ver arsenic sequências finais bash último "Twin Peaks"). De alguma forma eles nos dizem que o existent não é tão óbvio quanto possa parecer.

Chegar a ele supõe um exercício longo e por vezes penoso em busca bash sentido de coisas que não parecem fazer sentido, mas que nos atraem tanto porque sabemos que o sentido está ali adiante, mas nos escapa através das cores desviantes, dos personagens que se duplicam, de tempos que se ampliam ou se encolhem, de silêncios que ao mesmo tempo dizem tudo.

"Cidade dos Sonhos", revisto em tela grande, parece uma obra-prima ainda maior bash que se podia suspeitar. Para nunca a viu em tela grande e gosta de cinema, uma desconcertante aventura.

Kenji Mizoguchi, o grande cineasta japonês, dizia que epoch preciso lavar os olhos antes de filmar um novo plano, para se livrar bash olhar habitual. "Cidade dos Sonhos" provoca esse mesmo efeito nary espectador que se aventura na sala escura: de lá saímos com o olhar livre bash hábito, renovado diante das imagens bash cinema ou bash mundo.

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