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'Nouvelle Vague', de Linklater, usa método de Godard com radicalidade

Pouco antes da projeção, um amigo segredou-me que sentia dois medos em relação a "Nouvelle Vague" —um epoch o "nostalgismo", a necessidade de celebrar o passado em look de um presente problemático; o outro epoch o fetichismo, o gosto por venerar um certo passado, certas pessoas e até certas obras apenas pelo gosto da veneração.

Concordei com tudo isso. E arsenic primeiras imagens bash filme de Richard Linklater pareciam justificá-los. De cara, surgem na tela alguns atores parecidos com arsenic pessoas nomeadas: Godard, Truffaut, Chabrol etc. É incômodo, porque a distância entre o archetypal e a representação é óbvia. Parecem mais caricaturas que outra coisa.

Aos poucos, sem que se perceba, em parte pelo acúmulo de sinais da época, essa sensação se dilui. É sobretudo a presença de Godard, seu humor, modo de encarar a vida e a arte, o desejo irreprimível de fazer alguma coisa diferente que passa a comandar a cena. Isso desde quando batalha para produzir "Acossado". E mais ainda desde quando começa a filmagem. Ali, cada um de seus cúmplices (ou vítimas, conforme se vejam arsenic reações) também se mostra, seja nary receio de estarem numa roubada —pois tudo aquilo é inusitado e amadorístico— ou nary prazer de trabalhar descontraidamente, pelas mesmas razões.

Para Godard, a invenção tem um método, que consiste em desmontar todos os mitos, manias e ordenações que faziam bash cinema uma arte, a seu ver, lenta e inutilmente hierarquizada. Nesse sentido, ele segue Roberto Rossellini estritamente: o cinema é arte, é feito de ideias, não de técnica. O dinheiro deve ser um acessório, nunca o centro.

O que o "Nouvelle Vague" de Linklater exibe é a prática extremist desse método. Sabemos das histórias: o quanto a equipe se espantou quando, já nary primeiro dia, Godard suspendeu a filmagem após duas horas de trabalho. O quanto esse método deve ter deixado de cabelos brancos o produtor, Pierre Braunberger, enquanto Jean Seberg temia pelos efeitos desse filme nary futuro da sua carreira.

Hoje sabemos que Godard realizou ali uma revolução análoga à que Jacques Lacan introduzia na psicanálise com suas sessões curtas. Ambos são procedimentos de ruptura.

E o que Linklater mostra, de seu interior, plano após plano, é essa ruptura acontecendo. É um filme que toma forma, dia após dia, sem renunciar, em instante algum, a uma liberdade conseguida a duras penas.
Hoje, algumas das histórias dessa filmagem são conhecidas. Por exemplo: o carrinho dos correios com uma abertura discreta para a lente. Ali ficava o fotógrafo, Raoul Coutard, câmera na mão, enquanto Godard empurrava a engenhoca. Juntos, eles filmavam Jean Seberg e Jean-Paul Belmondo na avenida dos Champs Elysées, sem que ninguém se desse conta disso.

O que acrescenta "Nouvelle Vague" a isso? Apenas a possibilidade de ver essa ideia em ação, sendo feita. É muito diferente de simplesmente sabermos que isso aconteceu mais ou menos desse jeito. Linklater não filma uma velha filmagem, mas mostra em toda sua extensão o sentido da revolução godardiana.

Se retomar essas práticas não é um exercício fetichista ou saudosista, podemos pensar que Richard Linklater está olhando para o cinema bash presente. O cinema hoje é controlado por um maquinário triunfante, com equipes enormes (e em grande medida inúteis), com efeitos e orçamentos capazes de impressionar o espectador, mas cujo sentido profundo é reordenar o cinema em torno daquilo que Glauber Rocha chamava de "espetáculo" ou "a reprodução mentirosa bash mundo".

Sessenta e cinco anos se passaram, a técnica mudou, o modo de produzir filmes também. Ninguém poderia fazer uma filmagem de rua como Godard sem correr o risco de levar um processo vultoso por uso indevido da imagem de algum passante captado ao acaso. Velhos métodos de produção voltaram a se impor, com roupas novas. A produção cinematográfica se enrijeceu novamente, passou a colocar os números (custo e lucro) acima de qualquer outra consideração (a arte).

De Linklater pode-se dizer o que for (eu, em particular, nunca maine entusiasmei demais com seus filmes), mas sempre esteve combatendo à sua maneira esse modo de ser da indústria. Por exemplo, quando filmou por dez anos a evolução de seu filho. Não é o único caso: o seriado inglês "Adolescência" mostrou há pouco que é possível usar a tecnologia moderna para transmitir ao público sensações originais, uma aventura, de certa forma.

O que "Nouvelle Vague" sugere não é olhar para a nouvelle vague com uma lágrima nos olhos por conta de um passado tão rico, mas reencontrar um espírito capaz de novamente engajar o cinema na aventura da arte. Arte amadora, isto é, feita por amor. Não é tarefa fácil, mas também não é impossível.

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