Thomas Friedman, colunista do New York Times, sugeriu conferir um "Prêmio da Paz Neville Chamberlain" a Trump, pelo plano que seus enviados negociaram com o Kremlin. Discordo: o justamente vilificado primeiro-ministro britânico não merece a exagerada desonra. Chamberlain almejava a paz a qualquer preço; Trump só quer delimitar esferas de influência e fazer negociatas.
Em nome da paz, Chamberlain traiu a aliada Tchecoslováquia, entregando a Hitler a região dos Sudetos, na célebre Conferência de Munique de 1938. O plano de Trump representa uma traição da aliada Ucrânia, que deveria reconhecer a soberania russa sobre territórios ocupados e não ocupados pelas forças invasoras, reduzir suas capacidades combativas e renunciar oficialmente às candidaturas à União Europeia (UE) e à Otan.
Primeira diferença: a Tchecoslováquia amputada conservaria sua soberania; a Ucrânia seria convertida em protetorado informal da Rússia. Segunda diferença: a "paz" de Munique foi apresentada corretamente como exigência alemã; o plano para a Ucrânia, exibido falsamente como proposição dos EUA. Terceira diferença: a Tchecoslováquia declarou que não enfrentaria a Alemanha sem ajuda de tropas aliadas; a Ucrânia combate a invasão russa há quase quatro anos, às custas da morte de quase meio milhão de militares e mais de 60 mil civis.
Churchill fulminou Chamberlain: "entre a guerra e a desonra, escolheram a desonra —e terão a guerra". Nesse ponto, a equivalência faz sentido. A cessão da área não ocupada de Donetsk proposta pelos EUA implicaria a eliminação das principais linhas de fortificações defensivas da Ucrânia, propiciando à Rússia uma ofensiva desimpedida na região central ucraniana numa futura retomada da guerra.
O prêmio "Pior que Chamberlain" ainda não foi concedido a Trump, mas apenas porque seu governo enfrenta uma divisão. Witkoff, enviado do presidente, e Dan Driscoll, capataz do vice, JD Vance, traduziram para o inglês a lista completa das demandas russas e imprimiram a elas o selo da Casa Branca. Então, o secretário de Estado Marco Rubio entrou no jogo e, sob pressão da Ucrânia e dos europeus, acolheu mudanças substanciais na proposta, retirando-lhe o caráter de capitulação.
Ainda um tanto obscuro, o plano revisado parece incluir a cessão tácita, mas não formal, dos territórios ocupados e admitir a suspensão das sanções à Rússia. Contudo, não reduziria as forças armadas da Ucrânia ou vetaria, em algum ponto no futuro, seu ingresso na UE e na Otan. Mesmo amputado, o Estado ucraniano conservaria sua soberania, junto com a oportunidade de buscar segurança e prosperidade.
Putin dirá não. Só admitiria uma Ucrânia soberana diante de relevantes fracassos militares, algo que solicitaria aumento da ajuda bélica à nação invadida. O chefe do Kremlin confia em Trump. Crê, com excelentes motivos, que os EUA obterão para a Rússia, pela chantagem, o triunfo que suas forças armadas revelam-se incapazes de obter no campo de batalha.
Aos poucos, pressionando a Ucrânia a renovadas concessões, Trump faz o serviço sujo para Putin. O governo ucraniano poderia assinar o plano revisado num tratado de encerramento da guerra, mas a Casa Branca o obriga a acatá-lo como ponto de partida de hipotéticas negociações com a Rússia. Comparado a Trump, Chamberlain foi um estadista honrado.

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