Thiago Copetti, especial JC
Organizado pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar/RS), o seminário Campo das Ideias, realizado nesta quinta-feira (11), em Porto Alegre, foi muito além dos tradicionais temas voltados ao campo. O painel “A importância do Agronegócio para o Brasil e o Mundo”, que abriu o evento, deu o tom do que viria ao longo do dia.
O evento reuniu líderes como o governador Eduardo Leite, o presidente da Farsul, Gedeão Pereira, o cientista político Fernando Schuler, entre outros.
Primeiro convidado a falar aos cerca de 700 inscritos foi Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura e coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getulio Vargas. Rodrigues intercalou sua visão crítica sobre o agronegócio no Brasil com histórias pessoais divertidas - o que ajudou a amenizar a forma dura e realista com que tratou o tema em alguns momentos.
Assim como Rodrigues, o cientista político, economista e ex-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (o chamado Banco do Bric), Marcos Troyjo apresentou um cenário bastante realista, e nem sempre positivo, para a produção rural brasileira. Dificilmente alguém saiu incólume após as duas falas e a montanha russa formada por boas perspectivas e grandes desafios ao agronegócio brasileiro - dentro e fora do Brasil. Só restou ao público refletir e olhar suas próprias atividades rurais sob novas perspectivas e horizontes.
Era essa, justamente a proposta do evento, explica o superintendente do Senar/RS, Eduardo Condorelli: promover uma grande reflexão ao setor, por meio de painelistas que reúnem experiência de muitos anos em políticas públicas, que compreendem a articulação do agro com a sociedade e que ocuparam posições importantes no cenário nacional e internacional. “Temos dificuldade em encontrar sustentação em nível nacional e desafios em nível global. Somos o único País com capacidade de atender a futura necessidade mundial de alimentos, segundo a OCDE. Nosso papel é relevante globalmente, mas temos dificuldade para cumpri-lo. Os painelistas desse evento deram uma visão mais holística de toda a situação e indicaram caminhos e soluções à parte dos nossos problemas”, explica Condorelli.
Crença no potencial do agro, mas não na concretização
Primeiro painelista, Roberto Rodrigues foi incisivo na apresentação de dados que mostram que o Brasil pode muito mais do que os já gigantescos números alcançados. Lançou ao público até questões constrangedoras ao mostrar, por exemplo, que o Brasil se acomodou com sua baixa produção pesqueira. Da mesma maneira, não questionou o motivo de a fruticultura não ter maior papel nas exportações, com tanta riqueza, produtividade e diversidade.

Rodrigues foi incisivo na apresentação de dados que mostram que o Brasil pode muito mais do que os já gigantescos números alcançados TÂNIA MEINERZ/JC
“Temos 8 mil quilômetros de costa marítima, mas no cenário global das exportações não somos nem um traço (nos gráficos do setor, mundialmente). Nas frutas, somos o terceiro maior produtor, mas o 25º exportador. E o leite, onde o Uruguai nos supera? E no trigo, que desde sempre importamos?”, indagou Rodrigues. Afirmou que o Brasil tem condições de ser ainda mais potente nestas culturas e nas já bem desenvolvidas, como grãos. Após a exaltação à riqueza do agronegócio brasileiro, porém, tirou o brilho dos olhos de quem já via novas riquezas jorrando do campo e do mar. “Eu acredito que temos potencial para estarmos entre os maiores exportadores mundiais de tudo isso, indo muito além das sete culturas que já somos referência. O que eu não acredito é que isso vá acontecer”, ponderou o ex-ministro.
A descrença, explicou, vem da histórica ausência governamental brasileira em ter estratégias e criar condições para que potenciais se convertam em realidades.
“Não é a partir de uma estratégia que a soja tem a atual dimensão. Os primeiros gaúchos que subiram o Brasil semeando o grão o fizeram por conta própria. Não contaram com boas estradas, nessa jornada, por exemplo. Levaram desenvolvimento para outras regiões sem apoio logístico e infraestrutura. O que deveria vir antes, veio depois ", analisa Rodrigues.
Planejar a expansão de qualquer atividade agrícola, defendeu o painelista, precisa de um conjunto de ações muito distante do que os governos brasileiros têm, historicamente, disponibilizado. Faltam, e sempre faltaram, avalia o professor, aportes adequados em logística, financiamento e seguro - entre muitos outros investimentos. “Hoje mesmo vemos nascer um novo segmento industrial no agro, o de produção de biocombustíveis produzidos com grãos. E que estratégia temos para esse setor?”, finalizou Rodrigues.
O agro, a geopolítica e suas micro e macro questões
A montanha russa formada por boas perspectivas e desafios que concomitantemente existem no agronegócio brasileiro seguiu com a palestra de Marcos Troyjo, economista, cientista político e ex-presidente do Banco do Brics. Troyjo explicou, de forma bastante didática, como a geopolítica atual impacta no agro e influenciará nos rumos da produção agrícola do Brasil, com percalços a serem enfrentados, assim como os ganhos que se podem colher.

Troyjo explicou como a geopolítica atual impacta no agro e influenciará nos rumos da produção agrícola do Brasil TÂNIA MEINERZ/JC
Ainda que o agronegócio tenha se acostumado a olhar o cenário mundial para prever seus negócios, ele se direciona basicamente a safras internacionais e à Bolsa de Chicago. Não é usual agricultores e pecuaristas observarem movimentos não diretamente relacionados a sua atividade, mas com impacto direto sobre ela.
Como uma breve aula introdutória sobre relações internacionais, Troyjo mostrou duas formas de observar cenários mundiais, tentar antecipar movimentos e fazer conexões de seus impactos no campo e nas exportações. Na micro geopolítica, cujos impactos se estendem por até cinco anos, o exemplo são as ações de Donald Trump isolando o Brasil na área comercial e sem que nenhum dos dois presidentes, aparentemente, tenha intenções de reorganizar a crise atual.
“Não é apenas os Estados Unidos que podem acabar isolando ou trazendo prejuízos ao Brasil em seus negócios internacionais. Nações aliadas a Trump tendem, como forma de ‘agradar o chefe’, a se afastar do Brasil de diferentes formas, inclusive no comércio internacional”, contextualiza o economista.
Na esfera do macro cenário, Troyjo abordou o aumento populacional previsto para 2050, quando o mundo deve passar de 8 bilhões para 10 bilhões de pessoas. A previsão vem principalmente das populações da Índia, Indonésia, Paquistão e de cinco países africanos. “Esses 2 bilhões de pessoas a mais podem ser comparados com uma casa onde vivem quatro pessoas, com recursos limitados, e que terá mais uma para alimentar, consumir água e energia. Se ela terá de abrigar mais um hóspede que precisa prever e providenciar mais recursos que não falte nada para ninguém ", ilustra o cientista político.
Esse é um desafio global e não uma notícia positiva - pois é preciso pensar desde já em mais recursos agrícolas, água e geração de energia. Para o Brasil, no entanto, Troyjo diz que é uma grande oportunidade, especialmente para o agronegócio.
“Basta pensar, por exemplo, que o negócio brasileiro mal começou ou quase nada vende de alimentos para a Índia, que tem uma população com patamar baixo de renda mas tende a ampliar sua população e, assim, demandar mais comida e precisará buscar uma fonte para fornecê-lo e cada vez melhor”, avalia o economista.

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