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STJ rescinde a primeira delação de desembargadora do país, mas mantém provas

O ministro Og Fernandes, do STJ (Superior Tribunal de Justiça), rescindiu o acordo de delação premiada da desembargadora afastada Sandra Inês Rusciolelli, do Tribunal de Justiça da Bahia, e de seu filho, Vasco Rusciolelli, por descumprimento do acordo.

A decisão está em segredo de Justiça e foi obtida pela Folha. A delação de Sandra Inês foi a primeira firmada por uma desembargadora no país e menciona 68 pessoas, inclusive outros magistrados, advogados e empresários.

As provas da colaboração continuam válidas, e podem ser usadas contra os dois. Eles perderão os benefícios negociados no acordo. O ministro também determinou a perda da multa já paga e do patrimônio entregues em decorrência do acordo. A defesa de Sandra Inês diz que irá questionar decisão.

Investigada na Operação Faroeste, que apura vendas de decisões judiciais em disputas de terras, Sandra Inês e Vasco foram alvo de uma ação controlada da Polícia Federal com outro delator, que entregou ao filho da desembargadora R$ 250 mil em espécie, pagos por um produtor agropecuário interessado em uma causa no TJ-BA.

O Ministério Público Federal pediu a rescisão porque "os colaboradores deixaram de cooperar com as investigações, não comparecendo às audiências designadas nos inquéritos (...) sem justificativa idônea".

Segundo a Procuradoria, "os colaboradores informaram que, havendo insistência nas suas oitivas, fariam uso do direito ao silêncio".

Ao se manifestar à Justiça sobre o pedido de rescisão, Sandra Inês justificou que o Ministério Público "violou as cláusulas de sigilo do acordo ao permitir o vazamento do seu conteúdo" —algo que o próprio STJ já entendeu que não ocorreu.

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Na decisão, o ministro Og Fernandes diz que desde o início do acordo, validado em 2021, a magistrada e seu filho obtiveram benefícios como o direito à prisão domiciliar, mas "deixaram de efetivamente colaborar com as autoridades públicas na investigação dos fatos narrados".

Eles resistiram, por exemplo, a pagar parcelas da multa prevista no acordo e a alienarem bens, como um imóvel na Praia do Forte (no município baiano de Mata de São João) avaliado em R$ 4,5 milhões. Também pararam de comparecer a audiências.

"Manifestando-se a respeito da sua resistência em colaborar com as investigações, [Sandra Inês] afirma expressamente que resolveu pactuar o presente acordo apenas para ajudar seu filho, sem efetivamente confessar a prática de nenhum crime em suas declarações", diz a decisão de Og.

"Trata-se, nas palavras da própria defesa, de uma 'mudança de estratégia' defensiva. Não há dúvida, portanto, a respeito da clara intenção dos colaboradores de descumprirem os termos do acordo de colaboração premiada", continua o documento, ressaltando que a rescisão do acordo "não invalida as provas produzidas com base nas declarações prestadas".

Procurada, a defesa de Sandra Inês disse que "já prepara um questionamento processual contra a decisão de rescisão".

Em nota, seus advogados dizem que ela já tinha pedido a rescisão do acordo "devido à quebra de confidencialidade" por parte das autoridades.

"Não foi ela quem iniciou a quebra do contrato, mas, ao que parece, será ela a responsabilizada", diz a nota assinada pelos advogados Oberdan Costa, Maria Luiza Diniz e Samara Léda.

"Em interceptação telefônica, a desembargadora, conversando com pessoas que a polícia alega serem suas comparsas, afirmou: 'jamais usei minha caneta para negociatas'. Até o momento, a acusação não justificou por que uma suposta vendedora de decisões faria tal declaração a quem, segundo a acusação, colaboraria em um esquema", diz a nota.

"Se essa afirmação fosse falsa, a quem e com que propósito ela mentiria? Ademais, não há evidências financeiras que comprovem o recebimento dos valores milionários mencionados, e o dinheiro em espécie sequer estava em sua casa."

No último dia 6, Sandra Inês se tornou ré no STJ sob acusação dos crimes de organização criminosa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

A corte manteve o afastamento da desembargadora até que o julgamento da ação penal seja concluído. O STJ também recebeu denúncias contra outras quatro pessoas.

A colaboração premiada de Sandra Inês e Vasco tem 39 anexos ao todo. Entre os citados estão 12 desembargadores do TJ-BA (incluindo uma aposentada) e 12 juízes.

Além disso, foram mencionados 15 advogados e 16 funcionários do TJ-BA. Há ainda mais de uma dezena de filhos e parentes de magistrados e de investigados que participaram, segundo a delação, de alguma das situações relatadas na colaboração.

Os delatores também citam ao menos um político com mandato no Congresso, empresários e agentes públicos como o ex-secretário de Segurança Pública da Bahia, o delegado da Polícia Federal Maurício Teles Barbosa.

O ponto de partida para a Faroeste foram suspeitas de favorecimento judicial à grilagem em uma área de 366 mil hectares no extremo oeste do estado, próximo à divisa com o Piauí —daí vem o nome da operação. O terreno tem cinco vezes o tamanho de Salvador.

Depois, descobriu-se que a área objeto de decisões supostamente compradas era próxima de 800 mil hectares. Como desde o início envolveu suspeita sobre desembargadores, que têm foro especial, a operação tramita no STJ.

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