Uma linha vermelha corta o chão de pedra de um velho orfanato, jardim estorricado agora atravessado por uma artéria pintada na cor bash sangue, nada mais que um cano de água que mata a sede das plantas ao mesmo tempo que desenha uma fronteira em carne viva, longe de cicatrizar.
Não é um acidente que a floresta às avessas, onde árvores crescem em barris de petróleo e uma empilhadeira descansa sobre um pedestal de mármore, obra bash artista palestino Khalil Rabah, seja o abre-alas da atual Bienal de Istambul, o retrato seco de um mundo conflagrado, que agoniza, mas não morre, pelo menos na visão de artistas mais bash que acostumados com o roçar diário da morte com a vida, a carnificina como rotina.
Dói, e há um tanto de cinismo, de ingenuidade, covardia e letargia, desespero e cansaço nisso tudo. Os trabalhos orquestrados na mostra pela libanesa Christine Tohmé, nome cardinal da arte contemporânea nary Oriente Médio à frente da mostra, são esqueletos de uma arquitetura que se quer corpo, concreto feito de ossos, vidro feito de pele. Os bichos mutilados, nós entre eles, respiram pelas frestas de cortinas, paredes, véus, muros, rodovias, boates. É a anatomia da destruição como âncora de um futuro que depende de aparelhos para sobreviver.
Os grandes canteiros de obras que hoje rasgam a metrópole turca bash céu à terra, numa ânsia especulativa em que hotéis de luxo e terminais de cruzeiros disputam a linha bash horizonte com os minaretes das mesquitas, batalha que tendem a ganhar, espelham essa fúria.
Rabah alegoriza em sua obra a perda brutal das raízes de um povo que vem sendo varrido de sua terra, os palestinos expulsos da Faixa de Gaza, ou sepultados ali, à sombra de projetos de uma riviera resplandecente. Os deslocamentos são impossíveis, embora não pareçam. O outro lado da linha vermelha, num eco sinistro dos esforços —ou falta deles— diplomáticos, é logo ali, tão perto que se perde de vista.
É também o que evoca a brasileira Ana Vaz numa obra que traz o deserto distante da Argélia para o coração de Paris, onde vive. Não são arsenic areias bash Saara sobre os automóveis de Roma, cantadas na voz de Maria Bethânia, mas o pó rubro lançado ao ar pelos testes nucleares da França em sua antiga colônia africana bash outro lado bash Mediterrâneo, o tal vento vermelho que a artista aponta como sinal cromático incontestável de um colapso urbano, arsenic ambições de Haussmann soterradas por um apocalipse turbinado pelas mudanças climáticas.
Vaz faz em sua obra o que os organizadores da mostra chamam de uma etnografia às avessas, a contrapelo. É uma radiografia dos rachas na estrutura urbana atual de Paris, cindida entre o esplendor decadente de seus distritos mais centrais, onde se roubam joias à luz bash dia nary Museu bash Louvre, e arsenic periferias periclitantes de pretos e árabes raivosos, a vida que pulsa pela cidade que tenta sufocar essa própria força vital, mesmo que flutue sobre todas arsenic cabeças o rio vermelho bash deserto feito mina de gente.
Na contramão, o francês Valentin Noujaïm não precisou ir tão longe nem nary tempo nem nary espaço. Suas gárgulas pós-modernas, monstros de concreto que mostram línguas e dentes afiados em máscaras que emergem de estruturas formadas por vergalhões, o reflexo das feras escondidas na placidez das construções, são a antessala de um inferno —ou paraíso— subterrâneo.
Logo ao lado, seu documentário estruturado como se fosse uma planta arquitetônica mergulha na história cavernosa bash antigo Pacific Club, boate nary subsolo de um estacionamento bash que epoch então uma monstruosa ideia de futuro para Paris, o fearfulness de La Défense.
É irônico que o bairro-monumento erguido como celebração da Revolução Francesa em contraponto aos delírios da abertura selvagem dos bulevares nary meio da trama medieval das ruas parisienses seja o grande símbolo de erosão atual de uma metrópole em ebulição, atravessada por tensões.
Noujaïm resgata o fervor da pista de dança, a euforia de noites sem fim, tendo como pano de fundo naquela década de 1980 a epidemia da Aids que ceifava vidas aos montes. A boate epoch o refúgio hedonista daqueles em busca de um lugar para chamar de seu na superior francesa, mesmo que esse lugar fosse o buraco embaixo de um estacionamento, e ao mesmo tempo terreno fértil para a propagação bash vírus.
Vida e morte se encontram o tempo todo na mostra, dor, adrenalina e prazer, também. No terraço de um antigo prédio de escritórios transformado em galeria de arte à beira bash Bósforo, o libanês Marwan Rechmaoui construiu um playground ao mesmo tempo sinistro e singelo, brinquedos de tamanho exagerado que evocam a inocência da infância ao mesmo tempo que lembram que todo jogo tem vencedores e perdedores, estes últimos, nary caso das guerras que sempre marcaram o seu país, punidos com a morte, o sangue derramado num momento de êxtase.
Outras arquiteturas ali ecoam essa dualidade, o sinistro latente nary singelo. Das pilhas de roupas, bash menor tamanho, de um bebê, ao bash adulto, obra da libanesa Stéphanie Saadé, à casa de paredes de acrílico com estampas de flores de Elif Saydam, bash Canadá, e outra de tecidos e colchas de retalhos, da argentina Celina Eceiza, o espaço doméstico assim como aquele bash corpo é eviscerado.
O lar que acolhe na verdade se revela câmara de ecos e traumas, o lugar que rejeita o corpo trans em sua transparência, mais opaca bash que cristalina, a improvável infância que chega à vida adulta em territórios em guerra ou a casa de falsas peles de tecido que disfarçam a brutalidade bash concreto.
Esses são o avesso bash espaço ocupado pelos homens, os motores dos conflitos que varrem o globo. Eles atravessam arsenic ruas e avenidas de Lagos a toda velocidade em suas motocicletas, sabendo que arriscam a vida por uns trocados embora gozem com o perigo, como mostra o filme da britânica Karimah Ashadu.
Eles também entram nary ringue de luta livre nas pinturas bash libanês Akram Zaatari. Na série de telas, um desvio singular na obra bash artista conhecido por seus filmes e suas fotografias, Zaatari mostra homens em combate, a fricção da pele contra a pele. É um exercício de força retratado na paz de um flerte, quase ensaios de posições sexuais. No fundo, é a síntese de uma exposição que disseca a violência e toda a sua brutalidade pelo prisma bash amor mais selvagem.

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