Alvo de operação da Polícia Federal na sexta-feira (12), as emendas parlamentares ao Orçamento seguem com um sistema pouco transparente e que mantém ocultos os padrinhos de mais de R$ 1 bilhão em verbas, mesmo após o STF (Supremo Tribunal Federal) bloquear o pagamento dos recursos e exigir que o Legislativo adotasse novas regras.
Meses após o acordo que destravou o pagamento das verbas, o modelo adotado se provou inconsistente: consulta da Folha com base no ano de 2025 mostra que os dados estão espalhados por mais de 40 arquivos nos sites das comissões da Câmara e do Senado, com erros de diagramação, links que dificultam a consulta e formatos que não permitem trabalhar os dados.
Os portais de transparência impedem que se saiba de quem foi a indicação da despesa paga, uma vez que a autoria nos portais do governo é a da própria comissão; e quase 10% das verbas sequer identifica o autor, mantendo o uso das chamadas emendas de liderança —dispositivo os líderes partidários recolhem pedidos de suas bancadas, mas assinam a destinação do recurso, escondendo seu verdadeiro padrinho.
Em maio deste ano, o ministro do Supremo, Flávio Dino, decidiu que este mecanismo poderia ser usado apenas para direcionar recursos do próprio parlamentar que ocupa o cargo, e não poderia servir para ocultar quem realmente indicava a verba.
O Congresso também chegou a criar um sistema eletrônico (Sinec) para registro das emendas e envio às comissões e, posteriormente, ao governo, mas o acesso é exclusivo ao Legislativo. A divulgação é feita individualmente nas páginas das comissões, que nem sempre consolidam os dados.
Parte das indicações, por exemplo, acabou rejeitada por erros no cadastro (nome da cidade ou CNPJ incorretos, por exemplo) e foi refeita, sem que isso tenha sido identificado nas atas. Desta forma, os números podem aparecer dobrados. Como uma mesma emenda contém um volume grande de indicações, fica praticamente impossível saber qual parlamentar acabou beneficiado com o pagamento.
Na última sexta (12), a PF realizou uma operação contra o desvio de recursos de emendas parlamentares em endereços ligados a Mariângela Fialek, conhecida como Tuca, assessora que coordenou a distribuição das verbas na gestão do ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) e seguiu com esse papel sob a presidência de Hugo Motta (Republicanos-PB).
Para Dino, que autorizou a operação da PF, "há elementos que indicam que, apesar da troca de comando na Câmara dos Deputados, a investigada manteria, ainda, importante papel nas já conhecidas tentativas de perpetuação do malfadado orçamento secreto". A busca e apreensão ocorreu em um dos gabinetes da presidência, onde a servidora costuma despachar.
Tuca afirmou, por meio de advogados, que cumpria função "técnica, apartidária e impessoal" e que todo o material apreendido era público. Motta e Lira saíram em defesa da auxiliar, com o argumento de que ela era uma servidora da Câmara e que não há irregularidade no direcionamento das emendas.
No final de 2024, Dino bloqueou R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão, por falta de transparência. Esses recursos substituíram as antigas emendas de relator, que ficaram conhecidas por manter em sigilo a distribuição de bilhões em dinheiro público para bases eleitorais de deputados e senadores, com critérios de transferência políticos e sigilosos. Parte é investigada por desvios e irregularidades.
O Congresso negociou um acordo com o Supremo para liberar o pagamento das emendas de comissão e aprovar projeto de lei para garantir que tornaria público o nome do parlamentar que indicasse os recursos. A proposta, porém, ainda permitiu aos parlamentares driblar a determinação de Dino, designando como autor o líder da bancada partidária.
Levantamento feito pela Folha nas atas das comissões identificou que ao menos R$ 1 bilhão segue escondido sob a alcunha da liderança partidária. A liderança do PP da Câmara, por exemplo, distribuiu cerca de R$ 358 milhões desta forma –foi o partido que mais utilizou este expediente.
A maior parte dos recursos foi para o Piauí (estado do presidente do partido, o senador Ciro Nogueira), com R$ 189 milhões. Em seguida está o Rio de Janeiro, base eleitoral do líder da sigla na Câmara, com R$ 80 milhões, além de Tocantins e Alagoas (terra do ex-presidente Arthur Lira), com R$ 19 milhões cada.
Líder do PP na Câmara, o deputado dr. Luizinho Texeira (RJ) disse à Folha que "todas as emendas tem seus parlamentares responsáveis", e que talvez o sistema tenha vinculado de forma errada recursos que iriam para outros deputados como sendo de autoria da liderança.
Outras siglas que mais indicaram recursos sob a alcunha de "emenda de líder" foram o União Brasil, com R$ 266 milhões direcionados para 15 estados, e o Republicanos, com R$ 201 milhões. Hugo Motta, de acordo com as planilhas, indicou R$ 180 milhões em seu nome, mas outros R$ 77 milhões foram direcionados para a Paraíba sob a rubrica do líder do Republicanos, sigla da qual ele é o principal nome no estado.
Também constam nas planilhas como responsáveis por emendas de "líder partidário" Solidariedade, Avante, Podemos e PL, legenda do ex-presidente Jair Bolsonaro e que faz oposição ao governo Lula (PT).
Outro problema é com os dados em si. Os documentos que constam nas páginas de emendas da Câmara e do Senado trazem informações despadronizadas, não compiladas e com links errados, e mesmo com uso de inteligência artificial, a Folha não foi capaz de sistematizar as informações de forma a garantir que elas fossem comparáveis.
Na maioria das comissões, os dados estão em arquivos PDF, o que dificulta a leitura. São poucas as que disponibilizam os arquivos consolidados e em formato editável, como Excel, o que permitiria analisá-los.
Além disso, parte dos arquivos contém informações já desatualizadas, de acordo com técnicos a par do assunto.
O governo tem feito alterações no Portal da Transparência, entre outros canais de divulgação de informações sobre despesas federais, mas ainda não é possível localizar o autor de parte das emendas parlamentares.
Há cerca de R$ 50,4 bilhões em emendas parlamentares disponíveis no Orçamento de 2025, sendo que R$ 39,1 bilhões foram empenhados e cerca de R$ 27,4 bilhões estão pagos.
Procurada, a Controladoria Geral da União (CGU) afirmou que disponibiliza as informações de autoria até 2024. "A conclusão do Plano de Trabalho ocorrerá em breve e vai permitir a integração do Portal da Transparência [com] os dados de apoiamentos e solicitações de Emendas de Comissão do exercício de 2025 e dos anos seguintes", disse a pasta.

German (DE)
English (US)
Spanish (ES)
French (FR)
Hindi (IN)
Italian (IT)
Portuguese (BR)
Russian (RU)
9 horas atrás
5


/https://i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_59edd422c0c84a879bd37670ae4f538a/internal_photos/bs/2025/g/E/qmxsdPSLOP2vyAAzXsCQ/globo-canal-5-20250923-1800-frame-325079.jpeg)


:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_59edd422c0c84a879bd37670ae4f538a/internal_photos/bs/2023/l/g/UvNZinRh2puy1SCdeg8w/cb1b14f2-970b-4f5c-a175-75a6c34ef729.jpg)










Comentários
Aproveite ao máximo as notícias fazendo login
Entrar Registro