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Constituição da Itália e acordos de cooperação permitem extradição de Zambelli; entenda

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A intenção da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) de se estabelecer na Itália para escapar da condenação de dez anos de prisão pode esbarrar na Constituição italiana e em acordos de colaboração judiciária entre Brasil e Itália.

O caso foi levado ao governo italiano nesta quarta (4) por um deputado da oposição, que pede esclarecimentos sobre medidas que serão tomadas diante de um eventual pedido de extradição de autoridades brasileiras.

Após anunciar sua saída do Brasil, Zambelli afirmou que estava nos Estados Unidos e pretendia viajar para a Itália, país do qual tem cidadania. Segundo a deputada, o passaporte italiano a tornaria "intocável" e impediria que ela fosse mandada de volta ao país.

Diferentemente do Brasil, que não permite a extradição de seus cidadãos que tenham cometidos crimes, a Constituição italiana, em seu artigo 26, prevê que a extradição de um cidadão poderá ser permitida "quando expressamente prevista em convenções internacionais", mas nunca em caso de crimes políticos.

Zambelli foi condenada a dez anos de prisão, em maio, pela Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) sob acusação de comandar invasão aos sistemas institucionais do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) com o auxílio de um hacker e por falsidade ideológica. O objetivo seria emitir alvarás de soltura falsos e provocar confusão no Judiciário. Ainda cabe recurso ao Supremo.

O ministro da corte Alexandre de Moraes determinou a prisão preventiva da parlamentar e a inclusão do nome dela na lista de difusão vermelha da Interpol, que reúne foragidos da Justiça em várias nações.

Brasil e Itália mantêm, desde os anos 1990, tratados de cooperação em matérias penal e civil. Ratificado em 1991 na Itália, o acordo prevê a obrigação de extradição "de pessoas que se encontrem em seu território e que sejam procuradas pelas autoridades judiciais", para que seja dada continuidade a um processo pendente ou para fins de "execução de pena privativa de liberdade".

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Ainda que Zambelli tenha a dupla cidadania, ela viveu sempre no Brasil, o que poderá ser levado em consideração caso sua situação venha a ser analisada pelas autoridades italianas.

Citando esse ponto da legislação italiana, o deputado italiano Angelo Bonelli, do grupo Aliança Verde e de Esquerda, fez, nesta quarta (4), um pedido de esclarecimentos ao governo italiano sobre a intenção de Zambelli de ir à Itália.

Encaminhado aos ministérios das Relações Exteriores, da Justiça e do Interior, Bonelli pergunta quais medidas as pastas pretendem tomar diante do caso. Ele também pede a alteração da Lei da Cidadania, para que seja cassado o passaporte italiano de quem for condenado por crimes de golpe ou tentativa de golpe de Estado, contra a humanidade e de "incitação à subversão violenta da ordem econômica ou social".

"Zambelli afirma que, sendo cidadã italiana, ninguém pode lhe fazer nada. O ponto é que ela é também cidadã brasileira e não renunciou à cidadania brasileira. Por esse motivo, a Itália tem o dever de seguir com um pedido de extradição. É um ponto jurídico muito importante", disse Bonelli à Folha. "Vou envolver toda a oposição nisso porque tem o risco de ser um caso de vergonha internacional se a Itália der cobertura a uma criminosa", afirmou.

O caso da deputada tem como jurisprudência o de Henrique Pizzolato, ex-diretor de marketing do Banco do Brasil condenado em 2012 a 12 anos de prisão por corrupção, peculato e lavagem de dinheiro. Com o passaporte italiano do irmão, ele fugiu para Itália. Foi preso pela Interpol em 2014 e extraditado para o Brasil no ano seguinte.

Em seu anúncio, Zambelli afirmou que, ao ir para a Europa, pretende buscar lideranças de ultradireita. Disse que a primeira-ministra Giorgia Meloni precisa "entender" o que está acontecendo. A deputada disse ser perseguida política pelo STF e afirmou que "a esquerda está fazendo muito mal para o país".

Meloni lidera um governo de coalizão, formado por seu partido, Irmãos de Itália, pela Liga, de Matteo Salvini, e pela Força Itália, de Antonio Tajani. Os dois primeiros são de ultradireita, enquanto o terceiro é considerado de centro-direita.

Meloni e Salvini já fizeram declarações públicas de apoio à família do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), e expoentes de seus partidos mantêm elos com o grupo. Em abril de 2024, Eduardo Bolsonaro encontrou parlamentares europeus da ala conservadora para se queixar do que dizia serem violações da liberdade de expressão e perseguição política no Brasil.

Um deles foi Nicola Procaccini, do partido de Meloni. "Ouvimos diretamente dele [Eduardo] qual é a situação do Brasil e estamos preocupados. No fim, o verdadeiro perigo para a democracia não era Bolsonaro, mas sim Lula", disse Procaccini à Folha à época.

Um dos maiores pontos de contato entre os grupos foi justamente um caso de extradição –o do terrorista Cesare Battisti. Condenado por quatro homicídios ocorridos no fim dos anos 1970 na Itália, Battisti passou quase 40 anos como fugitivo da Justiça italiana, sendo 14 deles no Brasil.

Ele foi beneficiado por uma decisão de Lula, que, em 2010, concedeu refúgio político ao italiano. A decisão criou atritos com a Itália, que pedia a extradição. Por causa disso, Meloni fez diversas críticas públicas a Lula.

Em dezembro de 2018, ela relacionou Bolsonaro ao caso. "Com Bolsonaro no Brasil, abre-se finalmente uma brecha na rede internacional de radicais chiques que por décadas protegeu o terrorista vermelho Battisti. Esperamos que sua extradição seja confirmada logo, as cadeias daqui o esperam de braços abertos."

Em 2019, durante o governo Bolsonaro, o terrorista foi preso na Bolívia e voltou para a Itália, onde cumpre pena de prisão perpétua.

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