Do Yahoo Respostas à era da IA: como tirar dúvidas ficou mais solitário

Lançado em 2005, o Yahoo Respostas era um fórum aberto onde qualquer pessoa podia fazer perguntas e responder comentários sobre absolutamente qualquer coisa. O site rapidamente virou um fenômeno da cultura digital, com milhões de usuários e uma avalanche de dúvidas existenciais, curiosas e bizarras. Era o Google das pessoas que preferiam perguntar a pesquisar.

A dinâmica era simples: quanto mais respostas e votos positivos, mais “pontos” o usuário ganhava, conquistando prestígio dentro da comunidade. Mas o que parecia só uma brincadeira acabou se tornando uma das primeiras redes de conhecimento coletivo da internet e um grande retrato da mente humana online.

O Yahoo tinha um tom mais leve em suas perguntas e respostas em comparação com as ferramentas artificiais, como ChatGPT e Gemini Google. Isso acabou rendendo um baú de memes inesquecíveis por conta das respostas. Dessa forma, a experiência de tirar dúvidas se tornava mais leve e menos objetiva, já que era necessário aguardar respostas de outros usuários e interagir com outras pessoas para solucionar o problema.

De clássicos como “Posso engravidar na piscina?” e “Como saber se estou invisível?” até joias da criatividade como “O que acontece se eu comer papel alumínio e depois tomar Coca-Cola?”, o fórum colecionava momentos que beiravam o surrealismo digital. Algumas perguntas eram genuínas e outras eram para fins humorísticos, mas todas mostravam o mesmo espírito: a internet como espaço de troca e curiosidade, onde ninguém tinha vergonha de não saber. Era a cultura do “perguntar para o mundo”, muito antes de “consultar a IA”.

Mais do que um site, o Yahoo Respostas era uma comunidade onde pessoas de diferentes idades, países e níveis de conhecimento, se ajudavam mutuamente mesmo sem se conhecer. Havia quem entrasse só para rir, mas também quem encontrasse apoio, conselhos e até amizade.

“O Yahoo Respostas representava um tipo de socialização digital que hoje quase não existe”, observa Kaufman. “Era uma troca humana, com falhas e afetos, diferente do relacionamento impessoal que temos com as máquinas". Para a professora, o fenômeno mostra o quanto a dúvida era também um pretexto para o diálogo, não apenas para a obtenção de informação.

Com a chegada de ferramentas como o ChatGPT, o Gemini Google e outras IAs generativas, a relação com a dúvida se transformou. Hoje, perguntar virou uma interação privada entre humano e algoritmo: rápida, prática e solitária. As respostas vêm em segundos, mas sem o tempero do improviso ou da empatia que existia nos tempos do Yahoo Respostas.

“Estamos observando uma mudança na forma de buscar informação. As pessoas tendem a confiar no formato convincente das respostas da IA, mas, muitas vezes, deixam de verificar a veracidade do conteúdo”, analisa a pesquisadora. Segundo ela, essa automatização da informação traz riscos sociais importantes, já que “a desinformação compromete a confiança, atributo básico de qualquer sociedade".

A especialista ressalta que ainda é cedo para conclusões definitivas sobre os efeitos das IAs na interação humana, mas aponta um caminho. “Não significa que as pessoas estão se afastando umas das outras, mas que estão se relacionando de novas formas, inclusive com as tecnologias. O desafio é equilibrar praticidade e senso crítico", disse.

Se o Yahoo Respostas era o espelho da curiosidade humana, o ChatGPT é o reflexo da nossa pressa. De um lado, tínhamos a bagunça democrática da internet, onde qualquer um podia responder, rir, errar e aprender. Do outro, temos a precisão sintética das máquinas, que respondem tudo, mas escutam pouco. No fim das contas, resta a dúvida do que perdemos quando deixamos de criar soluções em conjunto.

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