O Congresso Nacional discute mudar o sistema eleitoral do país para o sistema distrital misto, que muda a forma como elegemos representantes à Câmara dos Deputados, às Câmaras Municipais e às Assembleias Legislativas.
A discussão ganhou força após a megaoperação contra o Comando Vermelho, no Rio de Janeiro. Congressistas a favor do tema afirmam buscar maior sintonia entre eleitor e deputado e barrar o ingresso de criminosos na política.
Atrás das cortinas, porém, membros do Legislativo ouvidos pela Folha dizem não ver impacto desse sistema contra a penetração de facções criminosas na política. Para eles, o objetivo do centrão ao patrocinar o projeto é ampliar o poder do grupo e reduzir o impacto de puxadores de voto, vários deles influenciadores digitais e com discurso antissistema.
Entenda como funcionam os dois modelos de sistema eleitoral debatidos e os pontos positivos e negativos da mudança:
Eleições proporcionais, o modelo atual
No modelo proporcional, o eleitor vota em um partido e/ou candidato. Mesmo que se vote em uma pessoa, o voto é computado também para o partido. Calcula-se o quociente eleitoral, um total de votos válidos dividido pelo número de vagas, que vai definir quanto é necessário para ser eleito.
Quando um candidato ultrapassa essa quantidade de votos, o partido pode utilizar o excedente para outros postulantes que não atingiram o quociente, preenchendo o máximo de cadeiras que o partido conseguir com o total de votos que recebeu, seja para ele mesmo, seja para candidatos.
Isso pode beneficiar partidos com nomes puxadores de voto: se o quociente eleitoral é calculado em 100 mil votos para ser eleito e um candidato recebe 1 milhão, o resto de seus votos serão usados para eleger outros nove representantes.
O quociente eleitoral costuma facilitar a presença de siglas menores no Legislativo, mas é pouco didático. O eleitor, em geral, não entende o motivo pelo qual um deputado foi eleito e esquece seu voto. Com isso, o poder de decisão fica mais centrado no desempenho individual do candidato.
Distrital misto, o modelo proposto
Esse modelo mistura alguns elementos do sistema proporcional, visto acima, e o sistema distrital, o utilizado nos Estados Unidos, por exemplo, e que elege representantes pela maioria dos votos.
No sistema distrital misto, metade das vagas no Legislativo para um estado ou em uma cidade são divididas em vários distritos eleitorais. O eleitor vota, então, no candidato em seu distrito, e esse voto conta também para o partido, que tem uma lista pré-ordenada de candidatos.
Por exemplo, de 70 cadeiras na Câmara para São Paulo, 35 seriam preenchidas pelos mais votados nos distritos, e as outras 35, pelo sistema proporcional. O modelo requer maior confiança nas agremiações, já que metade das vagas será definida pelas legendas, sem decisão do eleitor.
Por um lado, o eleitor se aproxima do representante, que foi mais votado naquela delimitação. Os partidos também saem fortalecidos, por poderem montar a lista de quem irá para o Legislativo, independentemente dos votos em candidatos.
Por outro lado, ele tende a reduzir o espaço para legendas menores e candidatos que representam minorias, já que, para se eleger no distrito, mais votos são necessários do que se houvesse um quociente eleitoral, como no sistema proporcional. Se menos candidatos de siglas menores se elegem, menos representantes esses partidos conseguem colocar pelo sistema proporcional.
Eleições e crime organizado
O sistema distrital misto é discutido no Congresso Nacional como uma forma de barrar a entrada do crime organizado na política brasileira. O PL 9.212/2017, de autoria do ex-senador José Serra (PSDB-SP), foi aprovado no Senado, mas está engavetado na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara. Ele foi ressuscitado após a megaoperação no Rio.
Nos microfones, os defensores da mudança do modelo de votação citam também a maior sintonia entre eleitor e congressista. Por outro lado, nos bastidores, deputados e senadores ouvidos pela Folha negam impacto desse sistema contra a penetração de facções criminosas na política —alguns afirmam, inclusive, que a mudança facilitaria o ingresso.
Juliana Sakai, diretora-executiva da ONG Transparência Brasil, aponta que a troca do sistema eleitoral não tem a capacidade de impedir o avanço do crime organizado na política e cita casos de prefeitos eleitos em 2024 ligados a facções criminosas. Para ela, a melhor saída seria fortalecer a Justiça Eleitoral e a prestação de contas dos partidos nas eleições.
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Centrão em causa própria
A proposta, articulada por legendas de centro e de direita hoje majoritárias no Congresso, é vista por alguns parlamentares como uma forma do centrão de ampliar o poder dos partidos e parte de um projeto de crescimento do grupo, ao diminuir ainda mais siglas pequenas.
Outro ponto apontado por congressistas contrários ao projeto é a definição geográfica dos distritos eleitorais. A forma como eles seriam desenhados poderia beneficiar quem hoje comanda o Legislativo federal, o que abre espaço para uma disputa similar à vista nos EUA. O Partido Democrata e o Partido Republicano patrocinam o redesenho de distritos para ampliar forças no Capitólio e desbancar o adversário.
Ainda, o histórico no país é de resistência à mudança no formato do sistema eleitoral —usamos o mesmo sistema desde 1932, e várias tentativas de mudança já foram realizadas. Os congressistas já pautaram o modelo distrital misto antes, além do distrital puro, chamado de "distritão", onde todas as cadeiras são distribuídas entre distritos e são eleitos os mais votados, sem contar o peso das agremiações.
Próximos passos
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), defendeu o projeto e escolheu como relator o deputado Domingos Neto (PSD-CE). O projeto precisa ser aprovado pela CCJ da Câmara e depois pelo plenário. Se a Casa fizer mudanças, ele volta ao Senado. Se as duas Casas concordarem sobre o texto, ele vai à sanção do presidente Lula (PT).
Se aprovado, o novo modelo não valeria para as eleições de 2026 (devido ao princípio da anualidade), mas sim a partir da disputa municipal de 2028 (para cidades acima de 200 mil habitantes) e na geral de 2030.

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