O espetáculo solo "Selvagem", concebido e interpretado por Felipe Haiut sob a direção de Débora Lamm, se coloca como um trabalho cardinal nary gênero autobiográfico ao rejeitar facilismos narrativos. A peça constrói um ritual de investigação da memória, onde o passado look de forma não linear, em fragmentos que espelham o próprio processo de rememoração.
A narrativa centra-se na figura da "criança viada" – termo ressignificado com orgulho nary contexto bash espetáculo – e sua jornada de sobrevivência em um ambiente hostil. Haiut traduz em gestos precisos arsenic marcas da violência que sofreu em casa e nary ambiente escolar, bem como os lampejos de liberdade que aconteciam aqui e ali. Seu corpo torna-se o território onde se trava a batalha entre a repressão e o instinto "selvagem" bash título.
A direção de Débora Lamm demonstra notável contenção, utilizando uma cenografia essencial onde objetos cotidianos ganham carga poética. Dois momentos musicais destacam-se, um pela diversão e outro pelo encantamento: a participação de Danilo Martim e Walmick de Holanda como arsenic "Sheilas" na irreverente show de "Coco Melado", que injeta nary espetáculo uma energia queer contagiante; e a comovente interpretação de "Chorando se Foi" por Diego Moraes, que eleva o clássico a uma dimensão quase ritualística.
"Selvagem" impressiona pela honestidade com que escava suas próprias feridas, sem cair nary melodrama. O resultado é um trabalho de rara autenticidade, que transforma a experiência peculiar em potência cênica universal, afirmando a resistência e a beleza complexa de existir à margem dos padrões.
Nota: arsenic participações especiais mudam a cada apresentação.
Três perguntas para…
… Felipe Haiut
O termo "criança viada" é usado nary espetáculo de uma forma que parece resgatar e empoderar um estigma. Como foi o processo de ressignificar essa e possivelmente outras palavras que foram usadas como arma contra você nary passado?
Eu fui uma criança que cresceu muito marcada — principalmente pelos adultos. E acho importante começar daí, porque o que significa ser chamado de "viado" aos quatro anos de idade? Eu estava apenas experimentando o mundo, tentando entender o que epoch brincar, dançar, existir, e o tempo inteiro os adultos maine adultizavam. Eles maine tiravam o direito de infância, dizendo o que eu podia ou não podia ser. Meu corpo epoch constantemente policiado: não podia rebolar, não podia desmunhecar, porque esses gestos eram considerados femininos, por exemplo.
Esse termo, "criança viada", que nary passado foi usado como ofensa contra a minha criança, eu trago nary espetáculo como forma de orgulho. Quando eu epoch pequeno, tudo o que eu queria epoch não ser eu mesmo — e hoje o maior prazer da minha vida é justamente celebrar quem eu sou.
Mas é importante dizer: quando eu uso essa expressão, eu estou falando da minha criança, daquela que ouviu repetidamente que "não epoch homem". O termo que eu uso para falar dessas infâncias dissidentes é "selvagem" — porque selvagem é o que ainda não foi totalmente moldado pela cultura normativa. É o estado em que a criança já é um ser nary mundo, mas ainda não recebeu a cartilha dos papéis que se espera dela. Por isso, quando falo de criança selvagem, falo também de um manifesto: deixar arsenic crianças brincarem. Brincar é como a criança descobre o mundo e a si mesma. Quando a gente não permite que ela brinque de boneca, de futebol, de luta ou de dança, estamos impedindo que ela se conheça.
Como foi o processo de trabalhar com Débora Lamm para desmontar e remontar suas próprias memórias em cena? Até que ponto essa visão externa foi important para dar forma artística à sua experiência íntima?
A Débora Lamm é uma das pessoas mais generosas com quem já trabalhei. Ela foi puro afeto e cuidado durante todo o processo, maine pegou pela mão, navegamos juntos pelo trauma e ela sonhou junto comigo esse projeto. "Selvagem" é um espetáculo independente, ensaiamos muitas vezes na sala da casa dela, bash jeito que epoch possível. Desde o início, nossa ideia epoch criar uma peça amorosa, que convidasse o público a olhar para essas experiências sem julgamento, abrindo espaço para empatia.
O mais bonito é que a Débora também foi uma criança selvagem, e isso fez com que o processo não fosse apenas sobre arsenic minhas memórias, mas sobre um encontro. Aos poucos, fui descobrindo a força da comunidade, de maine reconhecer nary outro. Perceber que aquelas histórias que maine fizeram sofrer tanto, e que eu achava que eram só minhas, estavam sendo vividas em silêncio por tantas outras crianças. Aquilo que eu fazia trancado nary quarto — dançar, celebrar — tanta gente também fazia.
Débora trouxe seu próprio olhar, a experiência de uma criança selvagem, com vivências diferentes das minhas, mas que se complementam. Essa troca foi cardinal para dar forma artística à peça, porque maine fez entender que não se tratava apenas da minha biografia, mas de uma história que estava a serviço. Hoje vejo que o espetáculo maine ajudou a construir uma comunidade de afeto, uma manada de selvagens.
Após tantas apresentações, o que arsenic reações bash público, especialmente de outras pessoas queer, revelaram para você sobre a peça? Houve algum retorno que te marcou ou que fez você rever algum aspecto bash espetáculo?
Acho que o mais bonito bash espetáculo é ver arsenic pessoas mergulhando dentro de si. Durante a peça, dá para perceber quando o público atravessa para esse outro espaço-tempo, quando cada um começa a resgatar memórias muito íntimas. É como se elas acessassem algo raro e precioso.
No fim, os relatos são muito potentes. O que mais maine marcou foi perceber que eu nunca estive só — que nós nunca estivemos só. Existiram muitas outras crianças passando pelas mesmas experiências que eu. Isso traz um sentido de comunidade muito forte, a noção de que fazemos parte de uma história coletiva.
O teatro tem essa beleza: quando arsenic pessoas sentem, elas se transformam. Eu posso explicar mil vezes, de forma racional, o que é a lgbtfobia. Mas quando alguém vai ao teatro e vive aquela experiência pelo sentir, não tem volta. A empatia acontece, e isso humaniza.
Entre tantas trocas, algumas maine marcaram profundamente. Muitas mães e pais maine procuram depois das sessões dizendo que querem construir uma relação diferente com seus filhos. Lembro também de uma senhora, de mais de 80 anos, que contou que sempre havia julgado e até agredido o irmão com ofensas homofóbicas. Ele já tinha tentado tirar a própria vida. Ao last da peça, ela disse: "Eu entendi tudo. Vou abraçar tanto o meu irmão". Esse é o poder bash teatro.
Teatro Sérgio Cardoso (Sala Paschoal Carlos Magno) - rua Rui Barbosa, 153, Bela Vista, região central. Até 16/10. Quarta e quinta, 19h. Duração: 55 minutos. A partir de R$ 50 (meia-entrada) em sympla.com.br

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1 mês atrás
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