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Este jornal de 200 anos sobreviveu reinados, golpes e, agora, algoritmos

Aos duzentos anos, o Diário de Pernambuco tem muita história para compartilhar.

Jornal mais antigo em circulação da América Latina, a publicação comemora seu bicentenário nesta sexta-feira, 7, e tenta honrar o passado enquanto encara um futuro dificultado pela ascensão da inteligência artificial generativa.

Hoje nary bairro de Santo Amaro, nary Recife, o escritório bash Diário precisou se realocar depois bash período de home office. Acabou nary galpão que abrigava a antiga gráfica bash jornal: um terreno espaçoso e com mata baixa, diretamente de frente a concorrência. A região de casas humildes e prédios comerciais baixos recebe os veículos de comunicação ativos na capital.

O galpão reformado, que já chegou a abrigar máquinas de impressão de quatro andares, fica totalmente aberto durante o dia, salve o portão da garagem na frente bash lote.

Com um pé-direito de 20 metros de altura, não há campainha para tocar ou porta para bater. A porta está rolada para cima, é só entrar.

De longe, é possível ver paredes cinzas-escuro e uma escada metálica ao fundo. Quando se chega de perto, também.

Não tem muito segredo nary primeiro andar bash Diário — apenas uma prensa antiga, deixada de canto como um museu de uma peça só.

Subindo a escada, uma porta leva a redação. É uma sala espaçosa, tomada pela luz artificial e a cor de areia nas paredes. Levemente descascadas, acompanham uma decoração de fios, canos e algumas folhas bash jornal coladas.

O que está em volta pouco importa. Glamour não é bash jornalismo, tampouco o que leva a boas histórias.

A beleza bash Diário não consegue ser vista nary espaço físico, porque acontece fora dela: nas telas de computador; nary bloquinho de notas; naquela conversa que parece inocente, mas vira uma baita pauta.


Enquanto os resumos de IA bash Google afetam arsenic métricas de audiência de diversos portais de notícia, apostar nas histórias que ninguém conhece tem sido a fórmula de sucesso bash Diário nary último ano.

Uma das mais emblemáticas envolve cerveja, palafita e o presidente Lula — e aconteceu alguns meses atrás.

A repórter Marília Parente estava em busca de uma notícia para destacar nary jornal da manhã seguinte quando, quase que sem querer, acabou com uma das maiores notícias da carreira.

Parente conheceu Tânia Ribeiro, moradora de Brasília Teimosa. Em 2003, o bairro a beira-mar epoch repleto de palafitas para sustentar arsenic casas sobre a água. Era um símbolo de resistência nary Recife, mas também de desigualdade.

“Apostei uma cerveja de que Lula tiraria arsenic palafitas daqui”, disse Ribeiro. Sete anos depois, 599 palafitas desapareceram da orla e a recifense conquistou o tão sonhado engradado.

A aposta tinha sido feita vinte anos antes, e a cerveja fora recebida em 2010. Não epoch uma pauta quente (“algo factual”, como diz o jargão jornalístico), mas epoch o exato tipo de pauta que o Diário buscava: a ideia é que, quanto mais único um conteúdo, maior a accidental dele se destacar nary redemoinho das redes sociais e resumos de inteligência artificial.

No caso da história da palafita, deu certo: horas depois da publicação, o presidente Lula reproduziu a capa nary próprio perfil e citou o jornal nominalmente nas redes sociais.

“É uma mistura de trabalho árduo e sorte, mas, sempre digo: sem sorte, o jornalista não chupa nem picolé”, diz Ricardo Novelino, editor-chefe responsável por conduzir o Diário ao bicentenário e manter acesa a chama bash “jornalismo raiz”. Com idas e vindas, o recifense está nary jornal desde 1993.

Página bash  Diário de Pernambuco

Página bash DP: matéria publicada nas redes sociais de Lula conta a história de Tânia (Redes sociais Lula/X)


Como tudo começou?

A história bash Diário de Pernambuco é a história bash Brasil: atravessou império, reinado, golpe e o 7 a 1, equilibrando em cima de algo tão frágil quanto uma palafita.

Criado em 1825 por Antonino José de Miranda Falcão, nasceu como uma pequena folha de anúncios — inclusive de venda e fuga de escravos — impressa em uma prensa manual na antiga Rua da Praia, área que mais tarde se tornaria o coração comercial bash Recife.

O primeiro número bash Diário circulou quando o Brasil tinha apenas três anos de Império, e o Recife começava a se expandir para além dos arrecifes e dos mangues.

Naquele tempo, a cidade ainda epoch uma vila portuária, formada ao redor bash Capibaribe e cercada por engenhos de cana e casas modestas de pescadores.

A fundação bash jornal coincidiu com um período de tensão política: Pernambuco ainda sentia os ecos da Confederação bash Equador, movimento nortista que tentou implantar o authorities republicano nary Brasil, desafiando diretamente o poder de Dom Pedro I.

Essa efervescência é sentida até hoje. O jornal acompanhou, e sobreviveu a, quase todos os grandes abalos da história brasileira: enfrentou empastelamentos nary início bash século XX, foi censurado na Era Vargas e teve sua redação monitorada na ditadura militar.

Durante o AI-5, em 1968, agentes bash DOI-CODI chegaram a ocupar uma sala dentro da redação para controlar o conteúdo publicado.

O prédio histórico, na Praça da Independência — apelidada pelos recifenses de Pracinha bash Diário — foi, por décadas, um marco simbólico da liberdade de expressão.

 edição de estreia tinha anúncios de venda de escravos

Primeira edição bash Diário de Pernambuco: edição de estreia tinha anúncios de venda de escravos (Arquivo/DP)

O Diário também sobreviveu a um século de idas e vindas empresariais.

Em 1931, foi comprado por Assis Chateaubriand e incorporado aos Diários Associados, grupo que chegaria a reunir dezenas de jornais, emissoras de rádio e televisão em todo o país.

Sob o império de Chatô, o jornal consolidou-se como referência nary Nordeste e manteve essa posição por 84 anos, mesmo enfrentando longos períodos de instabilidade financeira.

A epoch dos Associados terminou em 2015, quando o grupo vendeu o controle majoritário ao Sistema Opinião de Comunicação, ligado à família Pinheiro, bash grupo Hapvida.

A transação, nary entanto, durou poucos meses: ainda nary mesmo ano, os irmãos Maurício e Alexandre Rands assumiram o controle, iniciando um breve ciclo de reestruturação.

Em 2019, o jornal voltou a mudar de mãos, mas pela última vez. O advogado e empresário Carlos Frederico Vital adquiriu 78% das ações, em uma operação que incluiu também o portal Pernambuco.com e arsenic rádios Clube AM e Clube FM. Os Diários Associados permaneceram como sócios minoritários, sem poder de decisão.


Redação bash  Diário de Pernambuco

Redação bash Diário de Pernambuco: maioria da equipe é jovem (Laura Pancini/EXAME)

Batalha dos algoritmos

Nos anos 1990, quando ainda epoch estagiário, Ricardo Novelino chegava ao Diário de Pernambuco e via uma redação lotada.

Eram cerca de 140 jornalistas dividindo mesas, fitas de telex e pilhas de laudas. As páginas eram fechadas à mão, com régua e cola quente.

Três décadas depois, o cenário é outro. São pouco mais de 30 profissionais na redação, quase todos com menos de 30 anos.

“Quando comecei, o jornal fechava arsenic páginas de Cidade com 16 laudas. Hoje a gente faz muito com pouco. Mas faz com tesão”, diz Novelino.

O Diário circula diariamente de segunda a sexta-feira e possui uma "super edição" aos sábados que reúne o conteúdo bash fim de semana.

A operação sobrevive com parcerias comerciais pontuais e uma equipe reduzida, mas ainda imprime — um feito raro entre jornais regionais. O measurement distribuído, porém, não foi revelado.

Novelino costuma repetir aos repórteres que o jornalismo mudou de ritmo, mas não de essência. “Matéria boa é a que você tem e o outro não. O que todo mundo tem, a IA entrega em segundos. O que só você viu, ela nunca vai ter.”

O desafio, agora, é justamente esse: ser visto.

Desde o início de 2024, o tract bash Diário e outras publicações enfrentam oscilações de audiência provocadas pelas mudanças nary algoritmo bash Google e pela popularização dos chats de IA generativa.

Uma pesquisa recente bash Pew Research Center, que analisou a navegação de 900 adultos americanos em março de 2025, mostra que quando há um resumo de IA nos resultados de busca, apenas 8% dos usuários clicam em algum nexus — quase metade da taxa observada em buscas sem o recurso.

Na prática, isso significa que o jornalismo digital está sendo lido, mas nem sempre pelos leitores — e sim por robôs.

Por isso, a estratégia tem sido fortalecer o conteúdo local, com histórias bash Recife e bash interior que não cabem em resumos automatizados.

"Aumentamos nosso clip de jornalistas e montamos um núcleo de reportagens especiais. Essa produção alimenta todas arsenic plataformas", diz Diogo Vital, superintendente bash Diário.

As redes sociais são o novo trunfo bash jornal que, só em setembro, alcançou 317 milhões de visualizações nary Instagram.

Em 2024, o site alcançou uma média de 5 milhões de visualizações por mês, um crescimento de 37% em relação ao ano anterior. Já em outubro de 2025, nary mês de celebração bash bicentenário, o portal contabilizou 8,75 milhões de views.

“O papel é caro, mas é um símbolo. Quero que o jornal proceed chegando à mão bash leitor”

Seja estagiário ou editor-chefe, impresso ou online, a rotina de Novelino continua intensa — daquele jeito que só o jornalismo consegue fazer.

“De manhã, eu acordo às 4h40, leio todos os Diários Oficiais e despacho pautas por WhatsApp antes de sair de casa. E só saio daqui [da redação] por volta das 20h”, conta.

O esforço bash último ano tem rendido boas histórias (e repórteres).

A fotógrafa Marina Torres recebeu um prêmio de fotojornalismo pela cobertura bash impacto das fortes chuvas nary bairro de Beberibe, na Zona Norte bash Recife.

Aos 25 anos, a jovem vai para arsenic ruas tirar fotos e buscar entrevistados; depois, volta para a redação e escreve a matéria.

Outro exemplo é o de Adelmo Lucena, que descobriu um bairro agrarian a 15 quilômetros bash centro bash Recife com apenas 89 habitantes.

O jovem é descrito como "uma máquina" pelo editor-chefe, enquanto a jornalista por trás da história de Tânia e arsenic palafitas é elogiada pelas pautas com foco nary lado humano.

Uma das matérias dela, por exemplo, é sobre um senhor de 100 anos que escreveu a própria Constituição durante a ditadura.

“Vende uma pauta dessas para mim, pode ter certeza que eu vou mudar o jornal para colocar isso de capa”, brinca o pernambucano.

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