
Crédito, Bloomberg via Getty Images
- Author, Leandro Prazeres
- Role, Enviado da BBC News Brasil a Belém
Há 3 minutos
Executivos de empresas do petróleo, mineração e agronegócio receberam, após indicação do governo brasileiro, credenciais para ter acesso à chamada zona azul da COP30, onde ocorrem as negociações climáticas da conferência que discute o futuro do clima no planeta.
Entre os executivos estão os irmãos Joesley e Wesley Batista, da JBS, maior produtora mundial de proteína animal. Também há representantes de petroleiras como a Petrobras e Exxon Mobil, e de mineradoras como a Vale e a Samarco.
A informação sobre o credenciamento destes executivos consta de uma lista divulgada pela Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima (UNFCC) à qual a BBC News Brasil teve acesso.
Embora nem todas as reuniões da conferência sejam abertas, o acesso à zona azul permite o contato com diplomatas, políticos, negociadores climáticos e ativistas.
Os irmãos Batista e outros executivos da indústria do petróleo e mineração aparecem em uma tabela em que constam como host country guest, termo em inglês para designar "convidado do país anfitrião".
Essa lista tem 1.076 nomes e também inclui ambientalistas, cientistas e lideranças de organizações não-governamentais. Ao todo, a delegação do Brasil (incluindo funcionários do governo) tem 3.085 pessoas.
Ambientalistas ouvidos pela BBC News Brasil apontam que a presença de executivos de empresas vinculadas a setores como o agronegócio, mineração e petróleo nos espaços destinados às negociações climáticas é resultado do poder político e econômico que elas têm no país e no mundo.
Procurado, o governo federal enviou uma nota informando que "está comprometido em garantir que a COP30 reflita a pluralidade da sociedade brasileira" e que a conferência vai contar com a "presença de diferentes setores da sociedade civil e do empresariado".
A Petrobras confirmou que terá representantes credenciados na chamada zona azul, onde ocorrem as negociações e que o objetivo da empresa é "acompanhar e contribuir com os debates internacionais sobre clima e energia".
Em nota, a JBS não mencionou o credenciamento dos irmãos Batista, mas confirmou a presença de outros dois executivos da empresa no evento.
A Vale, por meio de nota, disse que participa das COPs "por entender que, para avançar na agenda climática, é necessário um esforço coletivo e consistente, que envolve diferentes setores da sociedade".
A Samarco, em nota, disse que a empresa participará da COP como "parte interessada no diálogo aberto, construtivo e transparente sobre as melhores práticas que o setor pode contribuir para o desenvolvimento sustentável".
A Exxon Mobil não respondeu aos questionamentos enviados pela BBC News Brasil.
Irmãos Batista

Crédito, AFP
Embora Joesley e Wesley Batista estejam na lista de credenciados na condição de "convidados do país anfitrião", uma fonte ouvida pela BBC News Brasil em caráter reservado afirmou que apenas Wesley participou da COP30, até agora. Ele teria vindo a Belém por apenas um dia.
Os irmãos Batista estão à frente da holding J&F, que segundo seu próprio site, é o maior grupo empresarial do Brasil com 300 mil funcionários e atuação no país e no exterior.
O grupo controla empresas de produção de proteína animal, energia, óleo e gás e mineração. A empresa mais conhecida do grupo é a JBS, maior processadora de proteína animal do mundo.
Em setembro deste ano, por exemplo, a organização não-governamental Greenpeace Brasil divulgou um estudo apontando que gado criado ilegalmente na Terra Indígena Pequizal do Naruvôtu, em Mato Grosso, foi comprado por unidades da JBS.
Segundo o relatório da organização, a cadeia de produção da JBS incluiu gado criado por produtores que haviam sido multados pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) por desmatamento ilegal.
À época, a empresa informou que as compras haviam sido feitas de acordo com as políticas da empresa e do setor, mas que bloqueou as compras da fazenda citada pelo levantamento da organização.
Os irmãos Batista, no entanto, também se envolveram em escândalos políticos nos últimos anos. Durante a Operação Lava Jato, os dois foram presos e firmaram acordos de colaboração premiada.
Em seus depoimentos, afirmaram terem pago vantagens indevidas a políticos de diferentes partidos, inclusive ao PT, e que tanto o então ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quanto a então presidente Dilma Rousseff (PT) tinham conhecimento do assunto. Lula e Dilma sempre negaram terem recebido recursos da empresa.
Após uma série de reviravoltas, o acordo de colaboração dos executivos foi rescindido e eles não enfrentam mais nenhuma acusação criminal.
Desde o retorno do presidente Lula à Presidência da República, em janeiro de 2023, os dois irmãos têm acompanhado diversas viagens do líder petista no exterior. A mais recente foi a viagem oficial feita por Lula à Indonésia.
Os dois também foram mencionados durante as negociações que resultaram na aproximação do presidente Lula com o presidente americano, Donald Trump.
As empresas do grupo doaram US$ 5 milhões para a festa de posse de Trump e, segundo reportagens publicadas pelo jornal O Estado de S. Paulo, os irmãos Batista chegaram a falar pessoalmente com Trump e interceder em favor de Lula durante a crise do tarifaço.
A BBC News Brasil enviou questionamentos à JBS sobre o credenciamento dos irmãos Batista, mas não recebeu resposta.
Petrobras e Exxon

Crédito, Bloomberg via Getty Images
A lista obtida pela BBC News Brasil também aponta a presença de diversos executivos da Petrobras e da Exxon.
A primeira é maior petroleira do Brasil, atuando na produção e refino de petróleo no país e no exterior.
A Exxon Mobil, por sua vez, é uma das maiores petroleiras do mundo, tem atuação no Brasil e, mais recentemente, intensificou sua atuação na Guiana, localizado em uma área próxima à chamada Margem Equatorial, região onde a Petrobras busca expandir suas frentes de produção.
Na lista de "convidados pelo país sede", há onze executivos da Petrobras e um da Exxon Mobil.
O setor petrolífero é apontado por cientistas e ambientalistas como um dos principais responsáveis pelas emissões de gases do efeito estufa no mundo.
Segundo estimativas da Organização das Nações Unidas (ONU), 68% de todas as emissões globais vêm da queima de combustíveis fósseis. Quando se trata apenas do dióxido de carbono, o percentual sobe para 90%.
Entre os executivos da Petrobras credenciados para a COP30 estão um gerente do setor de relacionamento internacional e a coordenadora de Comunicação de Crise. Também fazem parte dessa comitiva gerentes de projetos na área ambiental.
A atuação de petroleiras nas COPs não é novidade e vem sendo apontada por diversas organizações não-governamentais.
"O governo brasileiro tem vendido a Petrobras como uma empresa interessada em transição energética justa, mas 95% dos recursos da empresa advém do petróleo. Além disso, muito pouco tem sido investido nessa transição", afirma a diretora-executiva da organização não-governamental Instituto Arayara, Nicole de Oliveira, à BBC News Brasil.
"Com a presença tão intensa das petroleiras, o que a gente vê é que sempre que há discussões sobre o fim do uso dos combustíveis fósseis, elas atuam na direção contrária", diz.
A "transição para longe dos combustíveis fósseis" é um dos temas mais controversos discutidos durante as conferências do clima. Foram necessárias 28 conferências para que, em 2023, os países concordassem em apontar em um documento formal que era necessário dar início à redução dos combustíveis fósseis.
Ambientalistas afirmam que países e empresas privadas que exploram combustíveis fósseis fazem pressão no sentido contrário.
A presença da Petrobras na COP30 acontece menos de um mês depois de a empresa ter obtido licença para abrir um poço exploratório em um bloco localizado na Bacia Sedimentar da Foz do Amazonas, na costa do Amapá.
A liberação gerou críticas de ambientalistas pelos supostos riscos ambientais da exploração de petróleo na região e por representar uma nova frente de expansão de combustíveis fósseis no planeta.
Em nota, a Petrobras confirmou que terá executivos na zona azul da COP.
"Nas últimas COPs, a Petrobras também enviou profissionais. Para a companhia, essas conferências são uma oportunidade de discutir modelos sustentáveis, que associem a produção de energia com uso de tecnologia e inovação, soluções que mitiguem as mudanças climáticas e protejam o meio ambiente e as pessoas, gerando emprego, renda e desenvolvimento inclusivo para o país", diz um trecho da nota.
Vale e Samarco

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Outras empresas que também terão executivos credenciados como convidados pelo país anfitrião serão as mineradoras Vale e Samarco. Ao todo, as duas terão cinco executivos credenciados.
A Vale é uma das maiores mineradoras do mundo e com forte presença no Pará, onde atua na extração de minério de ferro.
Na Vale, foram credenciados, entre outros, a diretora de investimentos sociais, Flávia Martins Constant e o vice-presidente de assuntos corporativos, institucional e jurídicos, Sami Arap Sobrinho. Pela Samarco, foi a diretora de sustentabilidade da empresa, Rosane Gomes dos Santos.
As duas empresas estão envolvidas em dois dos maiores desastres ambientais da história do Brasil.
A Samarco é uma empresa controlada pela Vale e pela britânica BHP Billington. Em 2024, o governo federal firmou um acordo com a mineradora prevendo uma indenização no valor de R$ 132 bilhões.
Investigações no Brasil foram abertas para apurar as responsabilidades pelo desastre, mas, 10 anos depois, ninguém foi condenado.
Apesar de as investigações iniciais apontarem que a companhia tinha conhecimento dos riscos de rompimento da estrutura, até hoje, ninguém foi criminalmente condenado pela tragédia.
A Vale firmou um acordo prevendo o pagamento de indenização no valor de R$ 37 bilhões.
Em nota, a Vale justificou sua presença na COP30.
"A Vale tradicionalmente participa das COPs, por entender que, para avançar na agenda climática, é necessário um esforço coletivo e consistente, que envolve diferentes setores da sociedade. A mineração é essencial na jornada para uma economia de baixo carbono, integrando proteção e recuperação ambiental, circularidade, bem-estar das comunidades, empregados e desenvolvimento socioeconômico", disse a empresa.
A companhia também disse que, atualmente, 100% da energia usada pela companhia vem de fontes renováveis.
A Samarco também enviou nota sobre sua participação na COP30.
"A Samarco reconhece e lamenta o rompimento ocorrido em 2015, reafirmando seu compromisso com a reparação integral e definitiva, com resultados concretos já entregues e outras ações em andamento, sob acompanhamento de órgãos públicos e instituições de Justiça [...] A presença da empresa na conferência não significa negar o passado, mas assumi-lo, aprender e contribuir para soluções que evitem ocorrências", diz um trecho da nota.
Prática comum
Ambientalistas com quem a BBC News Brasil conversou afirmaram que a presença de executivos de empresas ligadas à indústria do petróleo, mineradoras ou à pecuária é uma prática comum durante as conferências do clima.
Eles alertam que ao mesmo tempo em que essas empresas são necessárias para discutir o futuro do clima no planeta, há o risco de que a presença delas exerça influência no processo de negociação do clima e de que se abra espaço para práticas como o greenwashing.
"Nas reuniões do clima elas [empresas] estão cada vez mais pujantes. Para citar um exemplo, no ano passado, na COP 29 [realizada no Azerbaijão], a delegação dos lobistas do petróleo foi a quarta maior delegação considerando todos os países", diz o cientista político e especialista em políticas climáticas da organização não-governamental Talanoa, Caio Victor Vieira.
Para Vieira, no entanto, a presença dessas empresas cria um dilema.
"Elas [empresas] estão muito interessados em como vão as discussões e querem participar cada vez mais. Só que aí começa a haver conflitos de interesses. O principal é que essas empresas não têm nenhum compromisso com a descarbonização real dos seus negócios", complementa.
Para ele, a presença dessas empresas em eventos como a COP30 pode ser interpretada como "greenwashing".
"A presença dessas empresas no espaço do clima são sempre vistas como greenwashing. Isso é comprovado porque elas vão para esses eventos apresentar soluções parciais ou falsas que tentam deturpar a atenção do que é efetivamente necessário para conter a crise climática".
Nicole Oliveira, do Instituto Arayara, tem uma avaliação semelhante.
"A presença deles influencia, sim [os rumos da negociações]. Quando olhamos dentro da cena doméstica, vemos que empresas do setor de petróleo, por exemplo, têm forte influência nas agências reguladoras. Agora, vemos isso nas COPs", diz Nicole Oliveira, do Instituto Arayara.
Para Alexandre Prado, líder em mudanças climáticas da organização não-governamental WWF-Brasil, a presença de empresas com a Petrobras, Vale e JBS na COP é esperada e, em uma sociedade complexa como a brasileira, não seria possível barrar a participação delas na conferência.
Ele pontua, no entanto, que é importante que a composição dos convidados do Brasil para a COP30 tenha um foco maior nas parcelas atingidas pelas mudanças climáticas.
"Temos que ter maior representatividade da sociedade, das pessoas impactadas pelas consequências das mudanças climáticas", diz.
Para ele, o principal problema detectado na lista foi a presença da Exxon Mobil, uma empresa americana, como convidada do Brasil.
"A Exxon é norte-americana. Caberia a ela pressionar o governo do seu país para que ele participasse da COP e não vir como convidada do Brasil. É uma vergonha", diz.
O governo dos EUA não participa da COP e Donald Trump tem rejeitado publicamente, sem evidências, que esteja em curso um processo de aquecimento do planeta.

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3 horas atrás
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