Líder em desmatamento proporcional na Amazônia, Rondônia foi o estado que mais recebeu máquinas pesadas compradas com recursos de emendas parlamentares na região desde 2015, com mais de 30% do total. Foram 507 equipamentos ao custo de R$ 319 milhões em verbas públicas em uma década.
No topo do ranking regional de distribuição de maquinário de grande porte financiado por emendas estão também os estados do Tocantins, com 253 unidades e gasto de R$ 109 milhões, e Mato Grosso, com 229 máquinas e despesa de R$ 145 milhões.
Embora os equipamentos possam ter finalidades diversas, a disseminação deles na área de floresta é vista por técnicos ambientais como um fator agravante para desmatamento, abertura ou pavimentação de estradas sem controle e instalação de garimpos ilegais.
O levantamento da Folha inclui produtos como trator de esteira e de pneus, escavadeira hidráulica, retroescavadeira, pá carregadeira, motoniveladora e rolo compactador. A apuração não leva em conta equipamentos de menor porte, como tratores agrícolas, caminhões e carros.
A contagem tem como marco inicial 2015, pois foi o ano em que uma alteração na Constituição obrigou o Executivo a pagar as emendas individuais pedidas pelos deputados e senadores e inaugurou um período de controle cada vez maior do Legislativo sobre o Orçamento, mudando a forma de fazer política no país.
Na última década, os congressistas brasileiros direcionaram mais de R$ 900 milhões em emendas para a compra de máquinas pesadas distribuídas pela Amazônia Legal.
Foram ao menos 1.649 equipamentos entregues a 467 municípios por meio de programas dos ministérios da Defesa, Agricultura e Desenvolvimento Regional.
Mais de 30% desses equipamentos foram para Rondônia, governado por Marcos Rocha (União Brasil) desde 2019. O estado ainda foi administrado pelo atual senador Confúcio Moura (MDB-RO), de 2011 a 2018.
Rondônia teve a maior taxa de desmatamento proporcional ao território entre os estados amazônicos desde 2015.
Foram 12 mil km² de vegetação suprimida, segundo dados do sistema Prodes (Projeto de Monitoramento do Desmatamento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite), divulgados pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Isso equivale a 5,1% da área do estado.
Somente a capital, Porto Velho, recebeu 329 máquinas. Segundo a plataforma de monitoramento MapBiomas, a cidade ficou em terceiro no ranking nacional de desmatamento em municípios de 2019 a 2025, atrás apenas de Altamira e São Félix do Xingu, no Pará.
A Folha enviou pedido de manifestação ao Governo de Rondônia sobre os dados de desmatamento e de recebimento de máquinas via e-mail, aplicativo de mensagem e telefone, mas não obteve um posicionamento da gestão sobre os resultados dos levantamentos até a publicação desta reportagem.
Dados do portal de transparência federal Transfere.gov mostram que a maior parte das emendas que forneceram máquinas para Rondônia na última década foram destinadas pela via do programa governamental Calha Norte, projeto criado pelas Forças Armadas brasileiras há mais de 40 anos e que tinha como objetivo original a atuação militar estratégica nas fronteiras.
Nos últimos anos, o Calha Norte teve sua finalidade histórica desvirtuada para se tornar um dos emendodutos preferenciais dos congressistas brasileiros. A sua desfiguração levou o governo federal a transferir o programa do Ministério da Defesa para o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional em 2025.
Apenas em emendas do Calha Norte, Rondônia recebeu 402 equipamentos, totalizando R$ 234,1 milhões na última década. Esse número representa mais da metade das 755 máquinas distribuídas pelo programa na Amazônia Legal.
Já por meio do Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional, o estado obteve R$ 80 milhões para a compra de 94 máquinas; destas, 89 foram para Porto Velho. Do Ministério da Agricultura e Pecuária, Rondônia angariou 11 produtos.
Ao se analisar o perfil das entregas para o Tocantins, o segundo colocado no ranking das distribuições, aparece outro ente público fundamental no xadrez político das emendas: a estatal Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba).
Turbinada por bilhões de reais em emendas parlamentares no governo Jair Bolsonaro (PL), a Codevasf mudou sua vocação histórica de promover projetos de irrigação principalmente no Nordeste para se transformar em uma estatal entregadora de obras de pavimentação e máquinas até em regiões metropolitanas.
Ela expandiu sua atuação da região semiárida para os estados amazônicos do Pará, Tocantins, Amapá e Mato Grosso e teve esse novo perfil mantido sob Lula (PT), assim como seu controle por congressistas ligados ao centrão.
Por meio da Codevasf, Tocantins foi beneficiado com a entrega de 174 máquinas pesadas financiadas com emendas no total de R$ 70 milhões.
Outro órgão público relevante nas entregas é o Ministério da Agricultura e Pecuária, que distribuiu R$ 140 milhões para a compra de equipamentos de grande porte na Amazônia.
Só o estado de Mato Grosso obteve mais da metade desse valor, R$ 71 milhões, dos quais R$ 59 milhões foram para a capital Cuiabá. O segundo estado que mais recebeu do ministério foi o Pará, com R$ 48 milhões.
De acordo com Hugo Cardoso, mestre em engenharia civil pela UFV (Universidade Federal de Viçosa), o trator de esteira, por exemplo, tem como uso primordial a remoção de vegetação.
"A principal função dessas máquinas é desmatar, abrir e finalizar estradas. O trator de esteira não é só o mais indicado para o desmatamento, ele é fundamental", afirma.
Em entrevista à Folha em setembro, o presidente do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), Rodrigo Agostinho, disse que há grande preocupação no órgão fiscalizador em relação ao uso ilegal das máquinas doadas com recursos de emendas.
"O que a gente percebe é uma utilização equivocada, uma utilização ilícita, em muitos lugares esse maquinário é um instrumento do crime. Da mesma forma que alguém usa uma arma para cometer um assalto, a máquina é o próprio instrumento para a prática do crime ambiental de desmatamento e de extração ilegal de madeira", afirmou Agostinho.
Em outubro, reportagem da Folha mostrou que o deputado federal Zezinho Barbary (PP-AC) usa sua fatia de verbas para regularizar a obra de uma estrada aberta com desmatamento ilegal no período em que ele próprio era prefeito do município acreano de Porto Walter.
As obras levaram a via a passar em propriedade rural da família dele e posteriormente invadir uma terra indígena demarcada.
No mês seguinte, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Flávio Dino acolheu pedido de entidades de combate à corrupção e determinou que a Polícia Federal investigasse o caso revelado pelo jornal.

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