É possível que uma parte da resistência e da adesão ao uso de câmeras dependa da confusão, quase winiccotianna, entre falsos e verdadeiros selfies. Mas é possível também que tenhamos uma segunda distinção a fazer, ou seja, entre os que tiram selfies para aprisionar um instante de celebridade e os que padecem desta síndrome, que eu acabei de inventar, chamada "mal de selfie".
Não creio que se trate da reedição da antiga prática dos caçadores, que como Ernest Hemingway, tiravam fotos com as carcaças dos animais abatidos, como prova de sua virilidade e testemunho de supremacia. Nas fotos não se encontram apenas a tradicional divisão entre derrotados e vencedores, mas uma espécie de confraternização entre os que participam de uma mesma festa. As armas não são erigidas em símbolo da vitória, como nos rituais terroristas, mas apresentadas ao modo de um detalhe da vestimenta, como que a combinar com as unhas pintadas de rosa modelo "chão de estrelas".
Andando pela Europa, constatamos, não sem uma certa vergonha, certo tipos humanos que se enfeitam para tirar fotos em um hotel de luxo, uma obra de arte ou uma destes monumentos históricos. É como se a enunciação da imagem fosse: "eu fui e você está aí vendo que eu estive lá", "sinta inveja de mim porque você está fora da cena, por favor".
Uma selfie banal deste tipo difere de um "mal de selfie" (onde há exposição humilhante de heróis e derrotados, onde também nos sentimos, sobreviventes e vivos, fora da cena)? Nos dois casos, a viagem só se completa realmente quando contamos nossa aventura para os amigos, repetindo os detalhes da aventura.
Mas a verdadeira viagem nos torna diferentes de que éramos antes, ao passo que a selfie de lacração apenas confirma quem a gente já era antes de qualquer coisa —mesmo que os outros não soubessem disso.
Uma boa viagem não existe sem a história que criamos e as ficções que inventamos sobre o que poderia ter sido. Desejamos que nossa forma de amar e trabalhar adquira a estrutura de uma viagem. A viagem nos reinventa, voltando para o mesmo lugar, mas agora diferentes.

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1 ano atrás
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