2 horas atrás 2

Motoristas de ônibus, bancários: veja o top 5 de afastados por saúde mental

Só para assinantes

Assine UOL
De 2023 para 2024, o número total de afastamentos por saúde mental pulou de 283 mil para 471 mil no Brasil
De 2023 para 2024, o número total de afastamentos por saúde mental pulou de 283 mil para 471 mil no Brasil Imagem: iStock

Motorista de ônibus, gerente de banco, escriturário de banco, técnico de enfermagem e vigilante.

Esse é o top 5 das categorias com mais pedidos de afastamentos por saúde mental reconhecidos como doença ocupacional. Os dados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) referem-se ao período de 2012 a 2024 e estão compilados no Smartlab, plataforma que cruza uma série de dados oficiais.

Chamados de B91, esses benefícios são pagos em decorrência de problemas de saúde gerados especificamente pelo trabalho. O INSS também paga a seus segurados o auxílio-doença (B31), em caso de enfermidades ou acidentes não relacionados à atividade profissional. O enquadramento no B91 ou no B31 é determinado pelas perícias médicas.

Os afastamentos por saúde mental vêm explodindo no Brasil. De 2023 para 2024, o total de casos (somando benefícios com ou sem ligação com o trabalho) pulou de 283 mil para 471 mil — um crescimento de 66%.

Especialistas ouvidos pela coluna avaliam que está em curso no país uma "era epidemiológica" marcada por transtornos mentais. Se tempos atrás destacavam-se as chamadas LER/DORT, lesões por esforço repetitivo causadas por tarefas mecânicas, o avanço da tecnologia tem levado a um crescimento do número de trabalhadores acometidos de sofrimento psíquico.

"Isso está baseado na dificuldade de atingir metas, na ausência de reconhecimento pelo trabalho, na baixa autoestima", analisa Paulo Rogério Albuquerque, doutor em Ciências da Saúde pela Universidade de Brasília.

As ações tomadas pelo governo para tentar reduzir a chamada "fila do INSS", no início do terceiro mandato do presidente Lula, são outra explicação possível para o recente salto de benefícios ligados à saúde mental.

O número de requerimentos pendentes de análise, no entanto, voltou a crescer com a restrição orçamentária do órgão. Atualmente, há 2,6 milhões de pedidos com avaliação pendente.

Reconhecer transtornos mentais como decorrência do trabalho ainda é desafio

"O transtorno mental relacionado ao trabalho enfrenta grande dificuldade para ser reconhecido, tanto pela empresa quanto pela Previdência Social", afirma a médica Maria Maeno, pesquisadora da Fundacentro, órgão vinculado ao Ministério do Trabalho e Emprego especializado em saúde e segurança.

Continua após a publicidade

Nesse top 5, a categoria com o menor número de B91 em relação ao total de afastamentos por saúde mental é a dos técnicos de enfermagem. Dos mais de 48 mil registros entre 2012 e 2024, só 8,17% dos pedidos foram reconhecidos como consequência do cotidiano profissional.

Na outra ponta, os gerentes de bancos são os que apresentam maior percentual de B91. Do total de 13.077 profissionais que pararam de trabalhar para cuidar da saúde mental, 37,76% tiveram benefícios enquadrados como decorrentes da sua atividade — quase quatro a cada dez profissionais.

Ainda no setor bancário, entre escriturários — carreira que funciona como porta de entrada no segmento — o número de trabalhadores com pedidos de afastamento reconhecidos como doença ocupacional é consideravelmente menor que o de gerentes. Só 18,77% dos quase 23 mil afastados no período foram enquadrados no B91.

"Isso revela uma epidemia silenciosa, causada por um ambiente de trabalho adoecedor, que mantém metas abusivas para aumentar os lucros bilionários dos bancos", afirma Neiva Ribeiro, presidenta do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região.

Lei que ajudaria reconhecimento é ignorada, dizem especialistas

Na avaliação de fontes ouvidas pela coluna, a lei federal 11.430/2006 — que cria o Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP) e facilita a associação de uma doença a um ambiente de trabalho — não tem sido devidamente aplicada.

Continua após a publicidade

Usando a metodologia do NTEP, é possível concluir, por exemplo, que trabalhadores de abatedouros de aves estão mais expostos a alguns tipos de tendinites, em função da alta carga de movimentos repetitivos na desossa dos animais. Dessa maneira, o perito poderia se basear nessa correlação para enquadrar automaticamente uma eventual LER/DORT de um empregado de frigorífico como doença ocupacional.

Mas não é o que tem ocorrido. "Existe um apagamento do nexo técnico epidemiológico", resume Maria Maeno, da Fundacentro.

Na avaliação de Rômulo Saraiva, advogado especializado em direito previdenciário e colunista na Folha de S. Paulo, a proporção de benefícios B91 em relação aos B31 deveria ser bem superior à demonstrada pelos dados. "A perícia do INSS não investiga a contento a etiologia ou concausa daquele adoecimento, nem mesmo procurar fazer o NTEP", afirma.

Paulo Rogério Albuquerque, autor da tese de doutorado que deu origem ao NTEP, segue a mesma linha de raciocínio. "Há um comportamento reiterado da perícia médica no sentido de desconsiderar a presunção legal, o NTEP, e a jogar [os benefícios] para causa difusa [desconsiderando a relação com o ambiente de trabalho]", avalia.

Procurada, a assessoria de imprensa do Ministério da Previdência Social não respondeu até o fechamento desta reportagem. O texto será atualizado se a coluna receber um posicionamento.

Qual é a diferença entre o B91 e o B31?

Se uma doença é classificada como ocupacional (B91), o trabalhador tem estabilidade de 12 meses depois de voltar à ativa. No B31, isso não acontece.

Continua após a publicidade

No B91, a empresa também precisa continuar pagando o FGTS durante o período de afastamento, o que não ocorre no caso do B31.

Além disso, o B91 incide sobre o cálculo do chamado Fator Acidentário de Prevenção (FAP). Quanto mais afastamentos por doenças ocupacionais e acidentes de trabalho uma empresa gerar, maior será o valor pago à Previdência para o custeio dos benefícios.

A ideia é penalizar os segmentos econômicos que mais produzem danos à saúde de seus empregados e beneficiar os que menos geram prejuízos à integridade dos trabalhadores.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Leia o artigo inteiro

Do Twitter

Comentários

Aproveite ao máximo as notícias fazendo login
Entrar Registro