Em seu depoimento, Arturo Béjar, diretor de engenharia do Instagram de 2009 a 2015 e consultor para combate ao assédio na rede de 2019 a 2021, disse que a filha e amigas dela tiveram "experiências terríveis" no Instagram e relataram os incidentes à plataforma, que não fez nada a respeito.
A situação também foi notificada por ele em 2021 em um e-mail para Mark Zuckerberg, presidente da Meta, dona da rede social, e outros executivos do alto escalão da empresa. Mas os chefes da rede decidiram não fazer mudanças significativas no aplicativo, segundo o ex-funcionário.
Zuckerberg é acusado formalmente em 41 estados americanos e na capital Washington de vetar os pedidos de funcionários para destinar mais recursos para proteger a saúde mental de adolescentes (leia mais abaixo).
A Meta alega que tem inúmeras pessoas trabalhando para manter jovens seguros na internet e que desenvolveu mais de 30 recursos para ajudá-los a terem experiências positivas na rede (veja a posição da empresa ao final).
Béjar fez uma última tentativa de alertar chefes em outubro de 2021, antes de deixar a empresa. Em sua mensagem, detalhada pelo Wall Street Journal, ele revelou a situação vivida por sua filha e as amigas dela:
- No intervalo de suas passagens no Instagram, Béjar e sua filha passaram mais tempo juntos e se dedicaram ao hobby de restauração de carros;
- A filha do ex-diretor da rede social começou a fazer posts na plataforma sobre o assunto, o que atraiu comentários indesejados, como o de um homem que disse só assistir aos vídeos dela "porque você tem peitos";
- A adolescente denunciou a conta, mas o Instagram afirmou que o comentário não violava suas diretrizes;
- Em 2019, quando a jovem tinha 14 anos, ela e suas amigas chegaram a receber nudes indesejados e a sofrer outras formas de assédio no Instagram;
- Segundo Béjar, elas afirmaram que o Instagram até agia em alguns casos, mas as decisões nesse sentido eram tão raras que elas desistiram de enviar denúncias.
Ainda em 2019, o ex-diretor do Instagram questionou antigos colegas de trabalho sobre o problema. E o que conseguiu foi um trabalho temporário de dois anos como consultor na equipe de Bem-Estar, criada justamente para diminuir experiências ruins dos usuários na plataforma.
Como consultor, ele ajudou a conduzir uma pesquisa com 238 mil usuários sobre a experiência deles com o Instagram nos sete dias anteriores.
Os números contrariaram outros dados da Meta, que apontam que só uma parcela muito pequena de posts problemáticos é, de fato, visualizada pelos usuários. Mas o alerta não foi bem recebido por gerentes da Meta, segundo Béjar afirmou ao WSJ.
Mark Zuckerberg, presidente-executivo da Meta — Foto: Reprodução/Facebook
Semanas antes do fim de seu contrato e sem notar a preocupação necessária de seus chefes diretos, Béjar enviou o e-mail para Zuckerberg e outros executivos da Meta: a então diretora de operações, Sheryl Sandberg, o diretor de produto, Chris Cox, e o chefe do Instagram, Adam Mosseri.
"Quero chamar sua atenção para o que acredito ser uma lacuna crítica na forma como nós, como empresa, abordamos os danos e como as pessoas que servimos os vivenciam", apontou o início da mensagem.
Na mensagem, Béjar afirmou que, duas semanas antes, sua filha, já com 16 anos, tinha feito uma postagem sobre carros e recebido o comentário: "Volte para a cozinha".
"Ao mesmo tempo, o comentário está longe de violar a política, e nossas ferramentas de bloqueio ou exclusão significam que essa pessoa irá para outros perfis e continuará a espalhar misoginia. Não creio que políticas/relatórios ou maior revisão de conteúdo sejam as soluções", continuou.
O ex-diretor afirmou que a Meta deveria se concentrar em lidar com experiências ruins dos usuários, em vez de focar tanto em seu sistema de regras. Para ele, a empresa deveria coletar dados sobre o que incomoda os usuários e isolar quem usa a rede com essa finalidade.
Os processos abertos contra a Meta citam e-mails internos em que executivos pediam para desativar uma ferramenta conhecida como "filtro da beleza", considerada prejudicial por especialistas ouvidos pela empresa.
Em uma mensagem, a então chefe de políticas públicas do Instagram, Karina Newton, escreveu que pesquisadores apontaram que os filtros que "imitam cirurgias plásticas" são "usados massivamente por meninas adolescentes", que são apresentadas a padrões de beleza inatingíveis.
A proposta ficou quase um ano sem resposta, até que Zuckerberg negou o pedido. Segundo o processo, o empresário disse que havia uma "clara demanda" pelo filtro e alegou, de maneira falsa, que não havia dados que as ferramentas eram prejudiciais.
Arturo Béjar, ex-diretor de engenharia do Instagram — Foto: AP Photo/Stephanie Scarbrough
Em nota, a Meta disse que, diariamente, inúmeras pessoas dentro e fora da empresa trabalham para manter jovens seguros na internet. A companhia também afirmou que tem mais de 30 ferramentas para ajudar adolescentes a terem experiências positivas na plataforma.
"As questões levantadas aqui em relação às pesquisas de percepção do usuário destacam uma parte desse esforço, e pesquisas como essas nos levaram a criar recursos como notificações anônimas de conteúdo potencialmente ofensivo e avisos de comentários", disse a empresa, segundo a AP.
Em relação ao material indesejado por usuários e que não viola regras do Instagram, a Meta afirmou que, desde 2021, reduz automaticamente o alcance conteúdo "problemático ou de baixa qualidade", incluindo desinformação ou postagens com palavrões, discurso de ódio ou imagens sangrentas.
Como denunciar postagens no Instagram, TikTok e Kwai e em outras redes sociais
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