Trump de perfil, falando com olhar sério

Crédito, Reuters

Legenda da foto, Governo Trump está 'punindo o sistema legal de uma democracia-irmã por aplicar a lei', argumenta Edward Luce
    • Author, Mariana Alvim
    • Role, Da BBC News Brasil em São Paulo
  • Há 14 minutos

O colunista do Financial Times (FT) Edward Luce publicou nesta terça-feira (22/07) um artigo com duras críticas à imposição de tarifas contra o Brasil pelo governo de Donald Trump.

Para Luce, quando o governo Trump justifica as tarifas criticando as investigações e o processo judicial contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, está "punindo o sistema legal de uma democracia-irmã por aplicar a lei".

De acordo com o colunista, também editor no jornal britânico, os paralelos entre Trump e Bolsonaro são evidentes — "a diferença é que Bolsonaro está sendo responsabilizado" na Justiça, argumenta.

Além de Trump, Luce critica também a postura do secretário de Estado americano, Marco Rubio.

"O mundo presta atenção ao que os Estados Unidos fazem, não ao que dizem. Mas se existe um farol liberal democrático hoje em dia na área de Rubio, ele vem de Brasília e Ottawa. Por enquanto, Washington está fora", escreveu o colunista.

Ao se referir à capital canadense, Edward Luce traz o país vizinho aos EUA como um dos exemplos em que a guerra tarifária americana acaba contribuindo para a popularidade dos mandatários — como a de Lula.

"Em queda nas pesquisas? Rumo ao esquecimento eleitoral? Mark Carney, do Canadá, Anthony Albanese, da Austrália, e agora Luiz Inácio Lula da Silva, do Brasil, têm uma solução para você. Faça com que Donald Trump lance uma guerra comercial contra o seu país. Poucas coisas unem os eleitores em torno da bandeira mais rápido do que um ataque de uma superpotência às suas receitas", ironiza o colunista.

Edward Luce, que já chefiou escritórios do FT em Washington e no sul da Ásia, diz que embora Trump se orgulhe de sua própria imprevisibilidade, esse é um de seus padrões.

"(...) Mesmo nos termos mercantilistas de Trump, suas ações não fazem sentido. Os Estados Unidos têm um superávit comercial com o Brasil. O país de Lula deveria, portanto, ter sido isento das tarifas do 'dia da libertação' de Trump", argumentou o colunista.

Colagem com fotos de Bolsonaro e Lula discursando

Crédito, EPA

Legenda da foto, Guerra tarifária contra o Brasil tem ajudado Lula e não Bolsonaro, argumentou colunista

Se o objetivo das tarifas contra o Brasil fosse não econômico, como ajudar um colega seu "homem forte"— no caso, Bolsonaro —, ainda faltaria lógica, argumenta Luce.

"Entre as principais vítimas de uma tarifa americana de 50% sobre o Brasil estariam os pecuaristas e os exportadores de café do país. Ambos os setores são redutos de Bolsonaro. Trump está, portanto, ajudando Lula, não Bolsonaro. Não é surpresa que a sorte de Lula tenha sido recuperada", escreveu o colunista.

Luce conclui que Trump está atuando para "promover autocracias", o que deixa "democracias-irmãs compreensivelmente alarmadas".

O jornalista traz como exemplo a Turquia, que apesar de ser superavitária em relação aos EUA, foi atingida por uma tarifa de apenas 10%.

"Não é pecado aos olhos de Trump que Erdogan [presidente da Turquia] tenha recentemente prendido vários prefeitos da oposição, incluindo Ekrem İmamoğlu, de Istambul, seu provável oponente presidencial. A inclinação de Erdogan para a autocracia pode até ter levado o presidente dos EUA a ter uma visão mais favorável da Turquia", escreveu o colunista.

Para ele, os conselheiros de Trump para políticas protecionistas é que deveriam estar se colocando mais de frente ao presidente americano.

"Se eles conseguirem ser ouvidos, poderão apontar que Trump está atrapalhando sua própria agenda. Na visão deles, as tarifas visam aumentar a capacidade interna dos EUA. Trump, por outro lado, usa essa ferramenta para tudo o que lhe agrada. E, olha, homens durões o agradam."