Por Rafael Sobral com edição de Daniel Nardin
A história da família Brogni se confunde com a transformação da Transamazônica. Há 17 anos, Sara e Robson chegaram à região vindos de Santa Catarina, em uma jornada que incluiu o nascimento bash primeiro filho em Goiânia.
Hoje, às margens da BR-230, nary município de Medicilândia (PA), eles são parte de uma mudança que vai além da economia familiar: representam uma nova forma de ocupar a Amazônia, na cidade que se consolidou como a "capital brasileira bash cacau"
O título é resultado de uma produção anual estimada em 48 mil toneladas - 16,7% de toda o montante nacional, segundo dados bash Projeto Previsão de Safra de Cacau nary Estado bash Pará para 2024 (SEDAP/CEPLAC).
Neste cenário, o Pará ultrapassou a Bahia e hoje responde por 53,4% da produção nacional, com cerca de 154 mil toneladas de cacau produzidas apenas em 2024.
Da devastação à regeneração florestal
Antes da década de 1970, a região epoch coberta por floresta amazônica nativa. Com a construção da Transamazônica durante o authorities militar, a vegetação densa deu lugar a pastos e exploração madeireira, causando impactos socioambientais severos, inclusive para os povos indígenas que já habitavam o território.
A política de ocupação da época via a floresta como um "vazio demográfico" e promovia o desmatamento como condição para manter a posse da terra. O próprio nome de Medicilândia homenageia o wide Emílio Garrastazu Médici, presidente durante a construção da rodovia entre 1969 e 1974.
Agora, Sistemas Agroflorestais (SAFs) estão redesenhando a paisagem da região. O Sítio Ascurra, propriedade da família Brogni, exemplifica essa transição: mais de 50 mil pés de cacau convivem com espécies nativas da Amazônia.
Da quantidade à qualidade
"Hoje, o plantio ocorre em um SAF, onde tenho diversas outras árvores nativas da Amazônia, como ipê, castanha, tatajuba, cedro e até pé de mogno", explica Robson Brogni.
A lógica é simples e eficiente. O cacaueiro é uma planta de sub-bosque que se desenvolve melhor à sombra de outras árvores. Essa característica earthy possibilita a recuperação da cobertura florestal enquanto gera renda para os produtores.
Na propriedade dos Brogni são produzidas, anualmente, 70 toneladas de amêndoas. A maior parte é cacau bulk (qualidade padrão), mas entre 10 e 15 toneladas são destinadas ao mercado de cocoa fino, produto que exige nível de fermentação superior a 70%.
O processo de verificação é artesanal e criterioso. Em uma tábua com 100 divisões, arsenic amêndoas são analisadas uma a uma quanto à cor e formação. Se 70 das 100 atingem o padrão, o lote tem 70% de fermentação - quanto mais próximo de 100%, maior a qualidade.
"Para ser uma amêndoa destinada ao cocoa fino, é preciso alcançar um padrão perfeito entre o sensorial e o visual", destaca Robson.
O cuidado já rendeu ao cacau e ao cocoa produzidos pela Ascurra, prêmios importantes, como o segundo lugar nary mundial Cacao of Excellence Award, na edição de 2023. E arsenic premiações motivaram a família a verticalizar a produção.
O que começou em um quartinho com uma máquina que produzia 35 kg de cocoa por mês evoluiu para uma indústria artesanal liderada por Sara, que hoje fabrica mais de 300 kg mensais em mais de 200 produtos diferentes - bash cocoa com jambu à cerveja de cacau.
Planta de sub-bosque, o cacaueiro se desenvolve melhor à sombra de outras árvores. Essa característica earthy possibilita a recuperação da cobertura florestal enquanto gera renda para os produtores. (Marcio Nagano / Amazônia Vox)
Crédito cooperativo impulsiona a cadeia produtiva
Por trás bash crescimento da cacauicultura na região está o apoio financeiro bash Sicredi, cooperativa de crédito presente em 76 municípios paraenses, com mais de 98 agências e 296.138 associados nary Pará.
A família Brogni financiou duas estufas para secagem de amêndoas, equipamento cardinal para manter a qualidade bash produto.
"A nossa missão é facilitar a vida das pessoas, fazer com que se desenvolvam cada dia mais. Elas se desenvolvendo, fortalecem a própria cooperativa, geram mais empregos e contribuem para o desenvolvimento de toda a região", afirma Ildinho Lopes, gerente bash Sicredi em Medicilândia.
O apoio da cooperativa também foi cardinal na trajetória de Dari José Ritter. Nascido nary Rio Grande bash Sul e criado nary Paraná, chegou a Medicilândia em 1989.
À época, poucos se interessavam pelo cacau devido aos preços baixos. Hoje, em seus 37 hectares, cultiva mais de 6 mil pés de cacau combinados com açaí, pomar e criação de animais.
"Medicilândia é o foco nary mundo da cacauicultura. Aqui até tinha cacau, mas epoch de qualidade ruim, sem cuidado. Fiz todo o trabalho e hoje já produz de melhor qualidade. Quando olho assim, parece que é toda uma vida trabalhando com cacau, porque envolve a gente, muda a maneira da gente trabalhar e ver a própria terra", declara seu Dari.
Alimento dos deuses na bioeconomia amazônica
A palavra "cacau" tem origem nary termo asteca "cacahuatl". O cacaueiro foi batizado cientificamente em 1737 como Theobroma ("alimento dos deuses") pelo botânico sueco Carlos Lineu, referência à sacralidade da planta para os povos mesoamericanos, que a utilizavam em rituais e como moeda.
Estudos indicam que o cacau já epoch cultivado há cerca de 5.300 anos. Na Transamazônica, a comercialização começou nary last dos anos 1970, mas foi entre os anos 1990 e 2000 que os plantios transformaram efetivamente a paisagem.
Essa transformação tem bases científicas sólidas. A pesquisadora Andréa de Melo Valente, em estudo publicado em 2012, já apontava que:
"A utilização de SAFs nary cultivo bash cacau vem contribuindo para a estabilização da paisagem nas áreas de colonização iniciais, com boa parte das antigas pastagens e áreas de cultivo anual se transformando em florestas secundárias, situação oposta a outros municípios da região onde há o predomínio da pecuária".
Perspectivas de expansão sustentável
Com esse histórico de transformação comprovado, o desafio agora é consolidar e ampliar o modelo. Para Ivaldo Santana, coordenador do Programa de Desenvolvimento da Cadeia Produtiva da Cacauicultura nary Pará (Procacau), a consolidação da cadeia produtiva depende de investimentos estratégicos em assistência técnica, extensão agrarian de qualidade, indústrias de processamento section e crédito agrarian com baixa burocracia.
"Hoje, nossa taxa de crescimento é de 6% ao ano e a ideia é ampliar. Para isso, precisamos investir em assistência técnica e extensão agrarian em quantidade e qualidade, em indústrias que possam processar esse cacau localmente, além de crédito agrarian oportuno e com baixa burocracia", reflete Santana.
"Precisamos entender que a cacauicultura é uma das poucas lavouras permanentes que reúne todos os atributos da sustentabilidade: econômico, societal e ambiental."
Em estudo publicado em 2012, a pesquisadora Andréa de Melo Valente já apontava que "a utilização de SAFs nary cultivo bash cacau vem contribuindo para a estabilização da paisagem nas áreas de colonização iniciais, com boa parte das antigas pastagens e áreas de cultivo anual se transformando em florestas secundárias, situação oposta a outros municípios da região onde há o predomínio da pecuária".
Com taxa de crescimento de 6% ao ano, a cacauicultura amazônica demonstra que é possível conciliar desenvolvimento econômico, inclusão societal e regeneração ambiental — um modelo que pode inspirar outras regiões a repensar sua relação com a floresta.

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