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Além das tarifas: China e EUA travam disputa no mercado cripto

Além da guerra tarifária e da disputa por influência global, China e Estados Unidos abriram uma nova frente de confronto: o mercado de criptomoedas. Os EUA, no entanto, largaram bem na frente, enquanto os chineses começam a se mover agora.

Historicamente, a China mantém distância do setor cripto. Nos últimos anos, o país chegou a declarar ilegais as operações com ativos digitais e proibiu tanto a mineração — processo de emissão de tokens — quanto a custódia desses ativos.

Em agosto deste ano, porém, Pequim deu o primeiro sinal de mudança ao considerar permitir o uso de stablecoins lastreadas em sua moeda, o yuan. As stablecoins são criptomoedas com valor atrelado a outro ativo — geralmente o dólar, ouro, euro, real etc. — na proporção de 1 para 1.

Hong Kong tem servido de laboratório para essa abertura. O território autônomo iniciou, no mês passado, o processo de emissão de licenças para empresas privadas interessadas em criar tokens ligados à moeda local.

Disputa com o dólar

Esse movimento ocorre no momento em que as stablecoins atreladas ao dólar ganham força e os Estados Unidos avançam na regulação do setor.

Atualmente, cerca de 99% das stablecoins em circulação estão ligadas à moeda norte-americana. As duas principais (USDT e USDC) somam valor de mercado de US$ 226 bilhões, segundo dados da plataforma CoinMarketCap, o que supera o valor combinado de gigantes como Petrobras, Itaú, Vale e Santander.

Em julho, o Congresso americano aprovou a Genius Act, lei que estabelece um regime regulatório para as stablecoins em dólar. Entre outras exigências, a legislação determina que as emissoras mantenham como reserva ativos altamente líquidos, como os Treasuries (títulos do Tesouro dos EUA) de curto prazo — o que, na prática, reforça a demanda global pelo dólar.

Em comunicado divulgado naquele mês, o secretário de Tesouro dos EUA, Scott Bessent, disse que essas criptos "reforçarão o status do dólar como moeda de reserva global, expandirão o acesso à economia do dólar para bilhões em todo o mundo e levarão a um aumento na demanda por títulos do Tesouro dos EUA, que lastreiam as stablecoins".

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Hoje, a empresa Tether, emissora da USDT, detém cerca de US$ 127 bilhões em Treasuries, o que a coloca entre os 20 maiores detentores desses títulos no mundo, à frente de países como Coreia do Sul e Alemanha.

Para analistas, a iniciativa chinesa de desenvolver stablecoins em yuan é uma resposta direta ao avanço das versões em dólar e à nova legislação americana.

Pequim vê a estratégia americana como uma ameaça e busca criar uma alternativa viável à infraestrutura financeira baseada no dólar.

Felipe Mendes, CEO da Altside

Stablecoin chinesa pode ganhar tração?

É possível que uma stablecoin de yuan ganhe espaço regional, mas dificilmente alcançará o mesmo alcance global das stablecoins em dólar no curto prazo, segundo especialistas.

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Hector Fardin, CFO da Avenia, emissora da BRLA, uma stablecoin brasileira, disse que o sucesso das criptos vinculados ao dólar é reflexo da confiança, liquidez e transparência da moeda americana.

O yuan, por outro lado, ainda enfrenta desafios estruturais, como controles de capital e menor previsibilidade regulatória, o que limita sua adoção fora da Ásia.

Hector Fardin, CFO da Avenia

Ricardo Dantas, CEO da Foxbit, disse que para que uma stablecoin atrelada ao yuan ganhar escala global, será necessário fortalecer a confiança internacional no ativo, garantir transparência regulatória e ampliar a aceitação por instituições fora da China.

"O principal fator favorável é o avanço do país no comércio com parceiros estratégicos e o uso crescente do yuan em acordos bilaterais, movimentos que podem criar demanda orgânica por versões digitais da moeda", disse.

Ascensão do yuan por diferentes caminhos

A China vem tentando ampliar o uso internacional do yuan enquanto o dólar perde, aos poucos, parte de sua hegemonia. Segundo dados do Fundo Monetário Internacional (FMI), a participação do dólar nas reservas globais caiu de cerca de 70% nos anos 2000 para menos de 57% em 2025.

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Até o momento, no entanto, umas das estratégias dentro do mercado cripto para expandir o uso de sua moeda foi a criação de uma CBDC, chamada yuan digital (e-CNY). Uma CBDC é uma moeda estatal controlada pelo governo, diferente das criptomoedas privadas, como bitcoin (BTC) e stablecoins.

Esse tipo de moeda digital, porém, enfrenta resistência dentro do ecossistema cripto justamente por causa do controle estatal. Nos EUA, por exemplo, o governo proibiu que o país desenvolvesse sua própria CBDC, alegando que esse tipo de ativo poderia ameaçar a estabilidade do sistema financeiro, a privacidade individual e a soberania nacional.

Hector Fardin, CFO da Avenia, disse que as CBDCs ainda enfrentam barreiras de confiança, privacidade e integração, e sua adoção está concentrada em projetos controlados pelo governo, em contraste com stablecoins, que prosperaram justamente por estarem em ambientes mais abertos e interoperáveis.

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