
- Author, Nicole Kolster
- Role, De Caracas para BBC News Mundo
Há 36 minutos
Enquanto o governo do presidente venezuelano, Nicolás Maduro, vive sob suspense ante a ameaça do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de executar ações militares na Venezuela, muitos cidadãos venezuelanos seguem a vida tentando resolver desafios básicos como botar comida no prato.
É quarta-feira de manhã no mercado popular de Quinta Crespo, no centro de Caracas, capital da Venezuela. Ali, uma possível escalada de conflito não parece perturbar a maioria.
"Não vai haver intervenção, nada disso. O que nos prejudicou foi a valorização do dólar", disse Alejandro Orellano, que toma um café enquanto espera clientes que não chegam, à BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC.
Desde setembro, o governo Trump reúne tropas e recursos militares a poucos quilômetros da Venezuela. O dispositivo inclui mais de 15 mil militares e o maior porta-aviões do mundo, o USS Gerald R.Ford.
Até a manhã de segunda-feira (24/11), ao menos sete companhias aéreas internacionais haviam cancelado voos saindo da e chegando à Venezuela após um alerta da autoridade de aviação dos EUA sobre os riscos de sobrevoar o espaço aéreo do país.
Há semanas, os EUA realizam ataques aéreos contra supostas "narcolanchas" no Caribe e no Pacífico oriental. Ao menos 83 pessoas morreram nos ataques.
O governo americano acusa os alvos de tráfico de drogas, mas até o momento não apresentou provas. Alguns analistas creem que os ataques são parte de um plano para forçar a saída de Maduro.
O governo venezuelano é considerado ilegítimo pelos EUA e vários países da América Latina após as polêmicas eleições presidenciais de 2024, amplamente criticadas pela comunidade internacional. O Brasil não reconheceu a vitória de Maduro.
Alejandro Orellano, que vende hortaliças neste mercado há cinco anos, minimiza a troca de ameaças entre os governos americano e venezuelano.
"Olha, veja como está vazio", insiste, apontando para um corredor longo e vazio, repleto de frutas e verduras frescas.

Crédito, Nicole Kolster/BBC Mundo
O inimigo comum entre os presentes parece ser a alta abrupta dos preços dos alimentos e a pouca capacidade de comprá-los.
Um quilo de frango, por exemplo, custa cerca de quatro vezes o salário mínimo mensal oficial. Mesmo com os bônus pagos pelo governo a pensionistas e servidores públicos, o dinheiro não cobre a cesta básica.
Outra realidade é que, desde os protestos antigovernamentais ocorridos após as contestadas eleições presidenciais de 2024, boa parte da sociedade venezuelana evita falar abertamente sobre assuntos que podem ser sensíveis para o governo Maduro.
Durante e depois das manifestações, mais de 2 mil pessoas foram detidas, segundo dados oficiais.

Crédito, Nicole Kolster/BBC Mundo
Atualmente, 884 pessoas seguem presas por motivos políticos, segundo a organização não governamental Foro Penal.
Há relatos de pessoas detidas após dar declarações à imprensa nas quais reclamavam do governo ou questionavam os resultados eleitorais.
Especialistas da Organização das Nações Unidas (ONU) denunciaram graves violações de direitos humanos no contexto daquelas eleições e dos protestos que ocorreram nos dias seguintes.
Eles relataram perseguição política, uso excessivo da força, desaparecimentos forçados e execuções extrajudiciais cometidas por forças de segurança do Estado e por grupos civis aliados.
'Será verdade? Será mentira?'
Sobre uma possível ação dos EUA no país, Consuelo, 74, é cética e hesita.
"Que aconteça o que tiver de acontecer… e pronto!", disse à BBC Mundo.
"Será verdade? Será mentira? Isso só deixa a gente doente, vivendo nervosa… é melhor manter a calma. As emoções também podem afetar a saúde", afirma a professora universitária aposentada, mas que ainda trabalha.
"Eu não saio comprando por impulso. Para isso, a gente precisa ter muito dinheiro."

Crédito, Nicole Kolster/BBC Mundo
Bárbara Marrero, confeiteira de 40 anos, disse: "Estamos todos esperando que algo aconteça, porque é justo e necessário. São anos mergulhados em uma miséria absoluta."
"Os venezuelanos vivem um dia de cada vez esperando que algo ocorra, mas todos têm medo [de falar], e ninguém diz nada."
"Estamos assustados, calados, com receio de ser presos. Eu sempre publicava coisas, mas agora não, não devo, porque não sei quem pode me denunciar", disse por telefone à BBC Mundo uma comerciante de Ciudad Bolívar, no leste do país.
"Há esperança, fé, mas as pessoas estão caladas de medo. Ninguém fala disso; é só dentro de casa, com os seus… mas há um ar de alegria", disse a mulher, sob anonimato.

Crédito, Nicole Kolster/BBC Mundo
Já é meio-dia.
Tudo segue como de costume em uma avenida movimentada no leste de Caracas. Camelôs chamam clientes, pedestres vão e vêm…
Ali está Javier Jaramillo, 57, que procura mercadorias para revender no Natal. Ele aguarda com expectativa o porta-aviões que os EUA enviaram ao Caribe.
"Não acredito que esse ataque vá acontecer. Acho que pode haver um diálogo, um acordo, um acerto."
Ainda assim, disse que, quando há cortes de energia, pensa: "Já entraram", "vão entrar".
De qualquer forma, Jaramillo insiste: "O que mais preocupa é a comida… Não acredito que vá haver um ataque."
"A Venezuela está muito mal (...) A inflação está nos consumindo, aqui não há dinheiro que valha dólar, euro."
"Sou um venezuelano passando necessidade… E o que queremos é que haja um acerto."

Crédito, Nicole Kolster/BBC Mundo
'Que ninguém durma!'
"Fiquem atentos, olhos abertos. Que ninguém durma!", pediu Maduro à população na noite de quinta-feira (20/11).
"Temos que defender as instalações petrolíferas da CIA. Deram dinheiro a eles e mandaram prejudicar a economia dos venezuelanos'", continuou o governante.
Maduro se congratula repetidamente pela gestão da economia venezuelana, afirma que o país está sob cerco dos EUA, entre sanções e o desdobramento militar no Caribe.
Dois economistas que vivem na Venezuela consultados pela equipe da BBC para esta reportagem preferiram não dar declarações por medo de represálias do governo.
"A inflação chegou a níveis da ordem de 20% ao mês nos últimos meses", disse outro especialista, que pediu anonimato.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) projeta alta de 548% nos preços neste ano e afirma que a situação será pior em 2026, quando a inflação pode chegar a 629%, a maior do continente.
Maduro, por sua vez, ressalta que o PIB do país crescerá 9%.

Crédito, Reuters
'Muitas pessoas inocentes podem morrer'
Esther Guevara, 53, que trabalha em um laboratório médico, é uma das poucas que não esconde a preocupação diante das tensões provocadas pelo envio da frota naval dos EUA.
"Fico apreensiva porque não sei realmente o que está acontecendo, se vão mesmo invadir, extrair… As pessoas acham que é muito fácil, muito tranquilo, e é algo sério. Muitas pessoas inocentes podem morrer."
"Sinto que algo está sendo preparado por aí, mas estou aguardando", afirmou.

Crédito, Nicole Kolster/BBC Mundo
"Trump precisa cair em si", disse Francisco Ojeda, 69, morador de Petare, bairro pobre de Caracas, e integrante da milícia do governo venezuelano, em conversa com a BBC News Mundo.
Ojeda participou de alistamentos militares convocados por Maduro e manuseou armas de guerra, embora sem munição.
"Aqui ninguém vai ficar parado diante de uma invasão", disse.
"Se vierem, vieram; se não vierem, tudo bem. Mas queremos tranquilidade e harmonia para todos."
"Nós estamos tranquilos… Aqui todo mundo dança, vai à praia, trabalha, tudo está normal."

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