A reestruturação do seguro rural desponta como uma das prioridades do Ministério da Agricultura e Pecuária após as perdas acumuladas no Rio Grande do Sul por quatro estiagens e duas enchentes em sequência. O assunto não constou das medidas anunciadas oficialmente no lançamento do Plano Safra 2025/2026 – o que gerou críticas do setor –, mas vem sendo tratado nos bastidores como estratégico pelo secretário de Política Agrícola, Guilherme Campos Júnior.
Homem de confiança do ministro Carlos Fávaro, ele é considerado peça-chave na engrenagem da Pasta. Com atuação técnica e trânsito político, assumiu protagonismo na formulação de soluções estruturais para o financiamento agropecuário. Campos aponta a necessidade de garantir previsibilidade e melhorar o uso dos recursos destinados ao seguro rural. Ele defende a diversificação das fontes de funding e, principalmente, a modernização dos mecanismos de proteção ao produtor rural.
Em entrevista ao Jornal do Comércio, o secretário afirmou que os modelos atualmente em vigor – como o Proagro e o Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) – estão defasados e que uma nova proposta está em construção, com inspiração no sistema dos EUA.
“Precisamos de um modelo mais eficiente e vinculado ao crédito”, resumiu.
A diferenças, porém, são superlativas. Enquanto no Brasil o valor autorizado para o seguro rural 2024 foi de R$ 1 bilhão – e nem todo o montante foi executado –, nos EUA o orçamento gira em torno de US$ 10 bilhões por ano.
Lá, o seguro rural é uma ferramenta consolidada e amplamente difundida. Embora não seja obrigatório por lei, sua contratação é exigida para o acesso a diversas linhas de crédito e programas federais de apoio, o que contribuiu para massificar a adesão dos produtores. Como resultado, cerca de 90% da área plantada com as principais culturas está atualmente coberta por seguro agrícola.
No Brasil, a contratação do seguro não é exigência formal para o crédito rural, e a adesão depende, em grande parte, da disponibilidade de subvenção pública para o prêmio. Como consequência, a cobertura é limitada e desigual entre culturas e regiões.
Outro aspecto é que o governo americano subsidia entre 60% e 70% do valor das apólices e divide o risco com seguradoras privadas, o que aumenta a atratividade e reduz o custo da proteção para o produtor. O sistema também conta com um mecanismo permanente de assistência em casos de desastres climáticos, que pode ser acionado pelo Congresso para complementar as indenizações do seguro convencional.
Já no Brasil, a subvenção ao prêmio do seguro rural varia entre 20% e 40%, podendo chegar a 45% para agricultores familiares, pelo Proagro, que tem cobertura limitada e está sujeito a entraves burocráticos. No entanto, o orçamento do PSR é anual, sujeito a cortes e disputado entre culturas e regiões. Essa limitação de recursos, somada à falta de previsibilidade, dificulta a expansão do seguro rural no País.
Entre as alternativas em estudo, o secretário citou a busca por fontes internacionais de financiamento, com menor custo e garantia de lastro, como forma de ampliar a cobertura e reduzir o valor dos prêmios pagos pelos produtores.
“Tem dinheiro barato lá fora que pode vir pra cá, lastreado, com garantia, e isso pode fazer com que a gente diminua o custo do prêmio e aumente a cobertura”, afirmou.
A construção de um modelo mais sustentável também passa por uma reavaliação do papel do Estado na subvenção ao prêmio do seguro rural.
“A gente precisa encontrar um modelo que caminhe para a sustentabilidade, que não dependa só do Tesouro”, afirmou, indicando uma possível transição para um sistema híbrido, com maior envolvimento de fontes privadas e internacionais de financiamento.
A proposta reforça a intenção do governo de estruturar um modelo mais robusto e menos dependente exclusivamente do Tesouro Nacional.
Campos admite que o PSR e o Proagro mostram "sinais de fadiga” e que é preciso avançar. Ele evitou antecipar o formato do novo modelo em estudo, mas indicou que o futuro do seguro rural brasileiro deve estar mais diretamente vinculado ao crédito e à adoção de práticas de mitigação de riscos, como o Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc), que já é exigido nos financiamentos com juros controlados.
A proposta também prevê o uso de tecnologia para automatizar a regulação de sinistros e facilitar o acesso do produtor.
“Queremos ampliar a previsibilidade, integrar seguro e crédito e dar mais estabilidade ao sistema”, completou o secretário.
Para ele, o Brasil precisa construir uma solução própria, inspirada em modelos de sucesso, mas adaptada às limitações fiscais e à diversidade produtiva nacional.
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