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O novo livro de João Villaverde é uma versão ampliada de sua tese de doutorado em administração pública pela FGV-SP. A riqueza do texto já seria um estímulo suficiente à leitura, mas a entrega vai além. Investigam-se as razões para o fortalecimento do Tribunal de Contas da União (TCU) na sua atuação em processos de impeachment.
Em "Nada será como antes: a ascensão institucional do TCU entre os impeachments de Fernando Collor e Dilma Rousseff" (Editora Fórum, 2025), com prefácio de ninguém menos que o Ministro Bruno Dantas, Villaverde nos convida a refletir sobre o TCU. Sua atuação foi, no mínimo, diferente, quando cotejados os dois processos de impeachment mencionados.
Antes, Villaverde é um jornalista brilhante, tendo passado pelo Estadão e pelo Valor Econômico. Não bastasse, enveredou para a vida acadêmica e política (hoje, é Secretário de Articulação Institucional da Ministra Simone Tebet, no Planejamento). No seu doutoramento, cuja defesa ocorreu em fevereiro de 2024, dedicou-se às razões históricas, institucionais, políticas, sociais e econômicas a explicar o papel do TCU no impedimento de Presidentes da República.
Na verdade, o avanço ou a mudança no papel do Tribunal de Contas da União (TCU), entre um e outro período, é fenômeno diretamente proporcional ao fortalecimento das instituições, na esteira da Constituição Cidadã. Os achados nos levam a refletir sobre o controle externo como atividade essencial à consolidação da democracia e ao progresso político, social e econômico do país.
Um dos membros ilustres de sua banca foi Luiz Carlos Bresser-Pereira, ex-Ministro da Fazenda, da Ciência e Tecnologia e da Administração e Reforma do Estado, que certamente influenciou a escolha do método histórico, a partir de entrevistas com figuras centrais. Colocou, assim, alguns tijolos novinhos em folha no belo edifício da construção de conhecimento na área de administração pública.
A tese nos convida a refletir: o amadurecimento institucional é fruto das inovações legais e constitucionais. Mas também comprova como a própria construção do Estado é dependente da prática. Esta, por sua vez, vinculada à atuação de servidores qualificados e bem recrutados e dos políticos eleitos.
Não se trata de avaliar, simplesmente, as razões deste e daquele processo de impedimento. O foco é trazer luzes ao "modus operandi" de uma instituição central para a República, a sua corte de contas.
Douglass North já nos ensinou sobre o peso das instituições no desenvolvimento das nações. Instituições fortes são essenciais para elaborar e executar políticas públicas e, assim, conduzir o Estado Democrático de Direito aos objetivos da nação. O próprio processo da Assembleia Nacional Constituinte (e seus resultados) evidencia como a Constituição de 1988 forjou-se na base da resposta ao período ditatorial, que tanto mal fez ao país.
O fortalecimento das atividades de controle externo deve ser entendido sob esse prisma. Fortalecimento e, vale enaltecer, aprimoramento.
Os processos democráticos não são lineares, como mostram os cientistas políticos. Avança-se, aqui, para retroceder acolá. No fim de um período, resta calcular o saldo e apreender as lições para o futuro. Sob instituições democráticas sólidas, ele é sempre positivo.
Melhor isso, sem dúvida, do que a alternativa. Churchill já dizia: a democracia é o pior de todos os sistemas, exceto todos os outros.
Quando Villaverde discute o apagão das canetas, logo pode ocorrer ao leitor a ideia de que o controle externo seria um empecilho. Na verdade, ele é parte da solução para que as administrações públicas, em todos os níveis, possam melhorar. Isso significa, na prática, entregar mais e melhores políticas públicas. Claro, sob a premissa de um Poder Executivo forte e com carreiras organizadas e valorizadas.
Evidentemente, a atuação do TCU e dos tribunais locais também deve evoluir, modernizar-se etc. É precisamente essa dimensão do livro que chama a atenção.
A lógica moderna do controle é muito menos punitivista e mais atenta à necessidade de colaborar para a construção de um Estado probo, muitas vezes, até de modo contemporâneo às necessidades do Executivo.
A lógica da filigrana contábil, da checagem do cumprimento de normas etc. é, hoje, complementada pela atuação dos órgãos de controle na direção de colaborar para que a política fiscal, tributária, orçamentária e cada uma das políticas setoriais avancem. O objetivo final é a entrega de serviços públicos capaz de dirimir mais rapidamente a desigualdade ainda elevada por aqui.
No caso da Presidente Dilma Rousseff, que Villaverde acompanhou, primeiro, com as lentes de jornalista, as operações que subsidiaram o processo foram descobertas pela tempestiva atuação do TCU. Não apenas as famigeradas pedaladas fiscais, mas as edições de crédito extraordinário sem justificativa, sem amparo constitucional.
Não vou, agora, entrar no mérito das razões do impeachment, mas o fato é que o TCU, sem dúvida, exerceu o seu papel. Os auditores e os ministros foram parte central do processo, em si, não custa lembrar. De um lado, o autor indica que o próprio fortalecimento institucional levou a esse resultado. Mas, em paralelo, a participação social e da imprensa exerceram as suas funções. Villaverde avança, na verdade, em relação ao que Bresser-Pereira já defendia em "Construindo o Estado Republicano" (Editora FGV, 2009).
Vence o interesse coletivo quando o controle e a execução podem caminhar, lado a lado, na busca pela eficiência, pela eficácia e pela responsabilidade com o dinheiro público, tudo isso "pari passu" à opinião pública. Nesse sentido, o livro suscita a reflexão sobre os caminhos a seguir. A ampliação do debate e a divulgação dos resultados da atuação do TCU, em diversas frentes, são essenciais para o aprimoramento constante do Estado brasileiro.
O livro (e a tese) de Villaverde, à luz da história e da literatura acadêmica relevante, é um chamado àquilo que se tornou, também para nós, inescapável, dada a conquistada condição de democracia consolidada: o respeito às regras do jogo. Afinal, nada mais será como antes em um país com capacidade para preservar e blindar suas instituições e, portanto, sua democracia.
Opinião
Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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