Militar espanhol com uma mangueira, em frente às chamas de um incêndio em A Espasa, Ourense (noroeste da Espanha).

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Legenda da foto, Cerca de 350 mil hectares já queimaram este ano na Espanha
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Este é mais um verão no hemisfério norte em que a Espanha é fustigada pelas chamas.

Os incêndios florestais são costumeiros nesta época do ano naquele país. Mas, desta vez, eles vieram com uma intensidade incomum, em meio a sucessivas ondas de calor que elevaram as temperaturas acima das máximas históricas em muitos lugares.

Bombeiros e moradores das regiões afetadas combatem cerca de 20 grandes incêndios ativos em diferentes pontos da Espanha, sobretudo nas províncias de Ourense, Zamora e León, no noroeste do país.

Cerca de 350 mil hectares de terreno já foram queimados este ano, segundo o Sistema Europeu de Informações sobre Incêndios Florestais (EFFIS, na sigla em inglês). Com isso, 2025 é o pior ano deste século na Espanha, em termos de área incendiada.

Quatro pessoas morreram, entre elas três bombeiros que enfrentavam o fogo. E milhares de pessoas foram evacuadas ante o avanço das chamas.

O governo espanhol mobilizou 4 mil militares para apoiar os bombeiros locais e pediu ajuda à União Europeia, que já começou a enviar pessoas e materiais. A imprensa espanhola descreve a ação como "o maior contingente de ajuda internacional da história do país".

Mas o pior ainda não acabou.

O primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, alertou que ainda virão dias "complexos" para o país. E a Agência Estatal de Meteorologia informou na segunda-feira (18/8) que, embora a onda de calor comece a diminuir, continua havendo "risco muito alto ou extremo de incêndios na maior parte da Espanha.

Existem quatro pontos principais que explicam por que o fogo está causando tantos estragos na Espanha em 2025.

Voluntários na Galícia ajudam na luta contra o fogo.

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Legenda da foto, Voluntários na Galícia (noroeste da Espanha) ajudam na luta contra o fogo

1. Primavera de chuvas e verão extremo

A ministra da Defesa da Espanha, Margarita Robles, declarou que "a Unidade Militar de Emergências nunca viu nada igual nos seus 20 anos de atividade". Ela se refere aos oficiais do exército dedicados a enfrentar os desastres e emergências na Espanha.

O país enfrenta, desde junho, sucessivas ondas de calor que se propagaram por mais tempo que o habitual e fizeram deste verão um dos mais quentes já registrados.

O calor e a seca extrema das últimas semanas contrastam com a primavera passada, que foi incomumente chuvosa. E a grande quantidade de precipitação contribuiu para o crescimento da vegetação.

Estas plantas, agora, estão secas e aumentam a magnitude dos incêndios enfrentados pelo país.

Homem sentado com as mãos da cabeça, em uma das regiões afetadas pelos incêndios na Espanha.

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Legenda da foto, Milhares de pessoas foram evacuadas frente ao avanço das chamas

"O fogo, favorecido pelo calor extremo, encontra muito mais combustível em forma de vegetação do que o habitual", explicou à BBC News Mundo (o serviço em espanhol da BBC) o especialista em Engenharia Florestal e Agrícola Víctor Fernández García, da Universidade de León, na Espanha.

"A situação é bastante grave", destaca ele. "Houve outros anos com recordes de incêndios, mas, este ano, o impacto social, o sofrimento das pessoas, está sendo maior."

Incêndio na Galícia.

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Legenda da foto, Cerca de 350 mil hectares de terreno já foram queimadas em incêndios na Espanha em 2025

2. O impacto das mudanças climáticas

As autoridades e os cientistas também responsabilizaram as mudanças climáticas pela violência dos incêndios deste verão na Espanha.

A ministra Robles indicou que, devido a este fenômeno causado pela ação humana, os incêndios, agora, têm "características distintas", que dificultam o combate.

Fernández García afirma que "alguns dos incêndios têm frentes de mais de 100 km e essas dimensões são incontroláveis".

Alguns dos obstáculos utilizados habitualmente em um país tão acostumado aos incêndios florestais, como a Espanha, são os corta-fogos nos campos. Mas, desta vez, o fogo os ultrapassou.

"As circunstâncias são excepcionais e nada está funcionando como deveria", segundo o especialista.

Homem lança água com uma mangueira em um incêndio em Lamas, na Galícia (Espanha).

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Legenda da foto, Especialistas indicam que alguns dos incêndios são grandes demais para que se possa extingui-los

Estas circunstâncias excepcionais parecem se dever, em grande parte, às mudanças climáticas.

"Sabemos que a região do Mediterrâneo é uma das mais afetadas e estamos observando incêndios similares em outros países, como Portugal, Grécia e Turquia", destaca Fernández García.

Nesses lugares, a coincidência entre verões secos e cada vez mais quentes e espécies vegetais que ardem com facilidade, como o pinheiro-bravo, contribuem para incêndios cada vez maiores e mais numerosos.

"Sabemos que, agora, mais coisas queimam de noite e a estação dos possíveis incêndios se alongou, devido às mudanças climáticas", indica o especialista.

Bombeiros tentam conter um incêndio na Galícia, no noroeste da Espanha

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Legenda da foto, Bombeiros tentam conter um incêndio na Galícia, no noroeste da Espanha

3. O abandono do campo

Outro aspecto que contribui para os incêndios são as mudanças produzidas na paisagem espanhola, à medida que as atividades agrícolas e pecuárias tradicionais são abandonadas, em benefício de outras mais rentáveis.

Fernández García explica que "antes, havia uma paisagem marcada por pequenas hortas ou chácaras, cuidadas por quem as explorava".

"Mas muitas delas foram desfeitas, o que permitiu o crescimento do mato ou de outro tipo de vegetação, dando lugar a uma paisagem mais contínua, na qual o fogo se propaga com mais facilidade e rapidez."

À medida que o desenvolvimento econômico levou muitos espanhóis do campo para a cidade, vastas áreas pouco povoadas ficaram para trás. Nelas, grandes superfícies de terreno ficaram sem uso, nem manutenção, como ocorre em algumas das zonas do noroeste do país, mais castigadas neste verão.

Moradores das localidades afetadas tentam combater os incêndios com poucos recursos

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Legenda da foto, Moradores das localidades afetadas se queixaram da falta de recursos para combater os incêndios

4. Falta de prevenção

Os trabalhos, agora, se concentram em apagar os incêndios. Depois, chegará o momento da busca por responsabilidades, mas os especialistas reivindicam que se dedique maior ênfase na prevenção.

"Ficou claro que os campos não estão sendo administrados", indica Fernández García.

O especialista acredita que foram cometidos erros no seu país e destaca alguns deles.

"As leis restringem práticas que, antes, eram habituais, como as queimadas controladas. Aprendemos que, muitas vezes, um pouco de fogo para queimar restos de colheitas pode servir para evitar que surjam incêndios maiores posteriormente."

Fernández García acredita que devem ser estudadas opções para dar uso ao solo florestal e incentivar algum tipo de ocupação e exploração do campo.

Outros especialistas destacam que os investimentos públicos para a manutenção e limpeza dos bosques vêm sendo reduzidos nos últimos anos. E muitos proprietários particulares não contam com recursos e subvenções para gerenciar seus terrenos florestais.