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- Author, Luis Barrucho
- Role, BBC World Service
Há 14 minutos
Donald Trump ainda não completou um mês no cargo em seu segundo mandato como presidente dos Estados Unidos, mas está implementando sua agenda a toque de caixa.
Seus apoiadores veem isso como o cumprimento de promessas de campanha. Mas analistas acreditam que fazer tantos anúncios sucessivos tão rápido também tem a intenção de sobrecarregar os oponentes e enfraquecer sua capacidade de resposta — uma tática conhecida como flooding the zone (inundar a área).
Eles argumentam que Trump usou essa abordagem em seu primeiro mandato, e agora ela está sendo adotada em uma escala maior.
Mas, afinal, o que significa esta estratégia, e o que Trump espera alcançar?
Do esporte à política
"Inundar a área" se refere a uma tática no futebol americano em que o ataque sobrecarrega a defesa adversária para explorar os pontos fracos.
Steve Bannon, ex-principal conselheiro e estrategista de Trump, afirmou em 2018 que a verdadeira oposição a Trump não eram os democratas, mas a mídia — e "a maneira de lidar com ela é inundar a área" com muito ruído.
Especialistas dizem que esta abordagem desorienta os críticos, impedindo-os de se unirem em torno de uma única narrativa.
"Trump não apenas define a agenda — ele passa o rolo compressor nela", diz à BBC Evan Nierman, CEO da empresa de comunicação de crise Red Banyan.
"Ao inundar a área, ele garante que nenhuma controvérsia prenda a atenção por tempo suficiente para causar danos duradouros. Escândalos que arruinariam outro político mal são registrados."
O objetivo dele é dominar o ciclo das notícias de forma tão completa que seus oponentes fiquem reagindo a ele, "enquanto ele dita os termos da conversa", acrescenta Nierman, descrevendo a estratégia de Trump como "calculada".
"A maioria dos políticos implementa políticas cuidadosamente; Trump vai direto para o espetáculo", diz ele. "Seja uma medida política, uma batalha jurídica ou um comentário improvisado, a estratégia é a mesma: permanecer na ofensiva, dominar a narrativa e tornar quase impossível que as críticas vinguem".
Michael Montgomery, professor da Universidade de Michigan-Dearborn, nos EUA, argumenta que a estratégia também dispersa a oposição.
"Ela envia pessoas e grupos em todas as direções para lutar um milhão de pequenas batalhas descoordenadas." Isso torna menos provável que os oponentes se unam contra ele, afirmou Montgomery à BBC.
Como parte desta estratégia, Katherine Cartwright, cofundadora da empresa de mídia Criterion Global, menciona outra tática: as revelações na sexta-feira, em que anúncios controversos divulgados no fim da semana perdem força, à medida que o interesse do público diminui ao longo do fim de semana.
Cartwright cita a polêmica nomeação do secretário de Defesa, Pete Hegseth, um ex-apresentador de TV. Os críticos argumentam que Hegseth não tem experiência em gestão e enfrenta acusações de abuso, as quais ele nega. Confirmado em uma sexta-feira para o cargo, "ele saiu dos noticiários na segunda-feira de manhã", disse ela à agência de notícias AFP.
O deputado democrata Jamie Raskin descreve o ritmo frenético de Trump como uma "sobrecarga sensorial avassaladora".
"Em um momento, estou ao telefone com uma pessoa que faz ensaios clínicos de medicamentos contra o câncer para o governo, e que está prevista para ser removida porque uma pequena parte de seu trabalho é alcançar a comunidade minoritária. No momento seguinte, estou conversando com advogados do Departamento de Justiça, e eles estão programados para serem transferidos involuntariamente. Simplesmente não para", disse ele ao The New York Times.
"Inundar a área é criar o caos que esgota sua oposição e aumenta o barulho, na esperança de que ainda mais americanos se desliguem e se afastem", afirma Montgomery.
Ele observa que isso deixa o segundo governo Trump "livre para fazer uma série de coisas que — se não estivessem enterradas sob tantas outras —. provavelmente receberiam muito mais atenção e oposição".
Visão dos apoiadores de Trump
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Os apoiadores de Trump veem sua enxurrada de medidas como prova de liderança e comprometimento com as promessas de campanha.
A deputada republicana Marjorie Taylor Greene disse ao The New York Times que a agenda de Trump foi endossada pelos eleitores, e que ele está trabalhando "o mais rápido possível" para colocá-la em prática. "Isso requer ficar acordado até tarde da noite", ela acrescentou.
Em seu podcast War Room, Bannon elogiou o ritmo do governo. "Se você observar a escala, a profundidade e a urgência que resultam de anos de pessoas trabalhando nisso", ele disse, "isso não aconteceu da noite para o dia".
"Só no acelerador, sem freio. Dirija. Dirija. Dirija", ele afirmou, acrescentando: "Quando você tem esse tipo de impulso, você não para, não pensa. Você vai, vai, vai!"
Ele também elogiou Stephen Miller, vice-chefe de gabinete para políticas da Casa Branca, considerado o mentor da estratégia de inundar a área durante o segundo mandato do governo Trump.
A estratégia já foi usada antes?
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Evan Nierman argumenta que a estratégia de inundar a área não é exclusiva de Trump.
"Líderes ao longo da história usaram a saturação da mídia a seu favor, mas de maneiras muito diferentes", diz ele.
"Os fireside chats ('bate-papos ao lado da lareira', em tradução livre, uma série de pronunciamentos de rádio) de Franklin D. Roosevelt, o uso habilidoso da televisão por John F. Kennedy e até mesmo o domínio da mídia digital por Barack Obama tinham como objetivo moldar a percepção do público."
No entanto, há uma diferença, segundo ele. "Trump faz isso em uma velocidade vertiginosa, sem filtros e com total imprevisibilidade."
Montgomery discorda, e vê as ações de Trump como sem precedentes. "Os 100 primeiros dias bastante atribulados de Franklin D. Roosevelt, em 1933, não foram uma tentativa de inundar a área para que iniciativas específicas do novo governo escapassem do escrutínio", ele observa.
"Não creio que haja exemplos anteriores de inundação da cena de Washington com inúmeras ordens e propostas para confundir ou ofuscar, por parte de presidentes democratas ou republicanos."
Será que pode funcionar?
Talvez seja muito cedo para dizer se esta estratégia vai funcionar para Trump. Na verdade, alguns especialistas dizem que esta abordagem pode acabar saindo pela culatra.
"Embora eu duvide que muitos dos verdadeiros apoiadores de Trump algum dia se cansem da turbulência que ele causa, acho que esta estratégia pode sair pela culatra para a direita, talvez já nas eleições de meio de mandato de 2026", diz Montgomery.
Ele observa que Trump e os republicanos não contam com um apoio esmagador entre os cidadãos americanos.
"Trump só ganhou no voto popular por cerca de 1,5%. Ele e os republicanos realmente não têm um mandato para mudanças pós-eleitorais regulares e habituais, muito menos para as mudanças extraordinárias que estão tentando realizar", afirma.
Nierman adverte que até mesmo os apoiadores de Trump podem sentir fadiga, "à medida que o caos constante se esgota".
"Este é o maior risco. A força de Trump é dominar a conversa, mas se as pessoas pararem de ouvir, esse domínio vai se transformar em ruído. Se isso acontecer, pode custar a ele eleitores indecisos que o apoiaram por causa das políticas, não apenas pela personalidade", conclui.
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