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Melo e Gabriel Souza precisam somar, diz Pedro Simon

De Xangri-Lá

Há 10 anos, o ex-senador e ex-governador Pedro Simon (MDB) concluiu seu último mandato, depois de ter exercido cargos públicos por décadas. Aos 95 anos, Simon segue atuando e conversando sobre política. "Estou aqui, pronto para continuar na caminhada", resumiu, ao receber a equipe do Jornal do Comércio em uma manhã de fevereiro, na sua casa no balneário de Rainha do Mar.

Líder máximo do seu partido no Rio Grande do Sul desde a luta pela redemocratização, Simon foi decisivo nas escolhas do MDB ao Piratini nas 10 eleições em que a sigla teve cabeça de chapa na disputa. Agora, diz que sabe que seu lugar, aos 95 anos, "é ficar em casa", mas que pode conversar e contribuir quando chamado. Ao projetar o pleito do próximo ano, diz que os dois principais quadros do MDB no Estado - o vice-governador Gabriel Souza e o prefeito reeleito de Porto Alegre, Sebastião Melo - precisam somar. "Um mais um é igual a dois. Um menos um é zero", ensina.

O decano evita indicar um nome para a disputa, avalia que Melo é um político que pode despontar até nacionalmente, mas é crítico sobre a possibilidade de renúncia ao Paço Municipal para concorrer ao Piratini, pelas experiências anteriores frustradas nas urnas de quem renunciou. E demonstra preocupação com o MDB gaúcho - "não elegemos um vereador em Caxias, nenhum vereador em Pelotas" -, defendendo mobilização para discutir projeto e para trazer novos quadros à legenda.

Simon também comenta o cenário nacional e, em vez do presidente Lula (PT) e do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), destaca os nomes do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), e do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (REP) como possíveis sucessores ao Planalto. Nesta entrevista, Simon também reflete sobre os 40 anos de redemocratização no Brasil, fala de sua luta pela volta da democracia ao País e avalia que não há riscos de ruptura institucional.

Jornal do Comércio - O senhor comemorou 95 anos, momento em que houve lembranças como sua luta pela redemocratização do Brasil. O que o senhor destacaria?

Pedro Simon - Primeiro destaque é eu estar aqui, com 95 anos, e pronto para continuar a caminhada. Foram anos difíceis, anos amargos, mas foram anos positivos no conjunto. Acho que o Rio Grande do Sul viveu sua página mais bonita. Tivemos a Revolução Farroupilha, tivemos grandes caminhadas, mas essa luta pela democracia foi muito bacana.

JC - E o Rio Grande do Sul teve um papel importante, com debates na Assembleia Legislativa, sobre a retomada das liberdades de imprensa, expressão...

Simon - Criamos o instituto de formação política Iepes (Instituto de Estudos Políticos, Econômicos e Sociais), nos reuníamos na Assembleia Legislativa. Era o único espaço para (debater) a democracia em todo o Brasil (no auge da ditadura militar). E nós, do MDB, reunimos todos os que quisessem estar na luta pela democracia e mandamos colocar todo mundo que estivesse de acordo com a plataforma: 1. Diretas Já; 2. Fim da Tortura; 3. Liberdade de Imprensa; 4. Anistia; e 5. Assembleia Nacional Constituinte.

JC - Como o senhor avalia a conjuntura do Brasil hoje, 40 anos após a redemocratização?

Simon - Lula até pode dar a volta no governo dele... Achei o ministério meio fraco, mesmo fazendo composições, tinha que escolher gente mais (qualificada)...

JC - O senhor disse que não vê risco à democracia do Brasil...

Simon - Eu não vejo porque o Brasil está preparado. Naquele auge da democracia, com Jango na presidência (1964), nunca se pensou que... e, de repente, deram um golpe. E foi golpe sem graça, não vimos tanque na rua, nada, e deram um golpe. Hoje não, hoje está todo mundo ressentido. E os próprios militares estão vendo que não podem entrar em outra aventura.

JC - Como o caso do episódio do 8 de janeiro?

Simon - Exato. E acho que a oposição também sabe disso. Então, não vai ser agora que estamos em plena democracia. Não tem perigo nenhum.

JC - O que o senhor achou da posse do novo presidente da Câmara, Hugo Motta (REP-PB), imitando o gesto de Ulysses Guimarães segurando a Constituição?

Simon - Gostei. Os dois discursos (dos presidentes da Câmara e do Senado) foram felizes nesse sentido. Já tiveram uma polêmica com o Supremo, deram recado... E até exageraram (na composição)... Tiveram (apoio de) todos os partidos.

JC - Apoio de PT e PL...

Simon - Até o MDB, todo mundo ganha um carguinho ali. Repara que (José) Sarney (ex-presidente do Senado e da República), Ulysses (ex-presidente da Câmara), aqueles grandes nomes, agora (presidentes da Câmara e do Senado) são nomes que não têm tanta história, biografia... mas tem presente.

JC - E essas defesas abertas de volta da ditadura por parlamentares. Até o prefeito Sebastião Melo, na posse, sustentou a liberdade de expressão inclusive para defender ditadura. Isso lhe preocupa?

Simon - Eu achei inoportuno falar nisso. Pra quê? Pra que dizer se vocês quiserem falar, falem? É uma inversão de valores.

JC - E a atuação dos Três Poderes hoje no Brasil? Está bem?

Simon - Nenhum está bem. Estamos vivendo uma confusão, principalmente o Judiciário. O Judiciário tem uma coisa boa, está decidindo. Ficava anos sem decidir... Agora, Lula foi para a cadeia condenado pela Justiça. "Porque Lula foi condenado pelo tribunal de Curitiba, tinha que ser condenado por Brasília." Que é isso? É um absurdo. Então, Lula está solto, é presidente da República, mas não foi absolvido... O Congresso está votando, mas estão exagerando nas emendas.

JC - O jornal O Globo publicou que antes era "toma lá, dá cá". Agora é só "dá cá"...

Simon - Pior que é verdade. A gente batia no centrão. Agora, o Congresso é centrão, os partidos, todo mundo. O Congresso está firme no debate com o STF. Agora, era bom nomear uma comissão de parlamentares séria e fazer um negócio limpo, direito e ser aprovado.

JC - Organizar e dar transparência às emendas no orçamento.

Simon - Isso vai colocar o Brasil no devido lugar.

JC - O senhor comentou Judiciário, Legislativo. E o Executivo?

Simon - Está difícil o governo Lula. Teve a vitória, tinha briga pelo centrão, montou um governo. E Lula fez o acordo que tinha que fazer... Agora, não podemos continuar com 40 partidos. Isso é loucura. Temos que fazer uma reformulação, cinco, seis, sete partidos...

JC - Cada um com posição.

Simon - Exato.

JC - Passando ao Rio Grande do Sul. Tem a discussão da dívida do Estado com a União...

Simon - Nossa tese era de extinção da dívida... Fazer um encontro de contas. Eu fiz 2.200 quilômetros de estradas asfaltadas no RS (no governo, 1987-1990). O Sarney (presidente na época), não tinha um tostão. "Eu faço e tu paga." Ninguém deu um tostão ao RS até agora, não deram nosso dinheiro. Tem a Lei Kandir...

JC - Qual é a sua avaliação do governo Eduardo Leite (PSDB)?

Simon - O Rio Grande tem um problema enorme. E o Leite tem feito o que pode no meio dos problemas... Também tinha um pouco da responsabilidade, o PSDB estava desaparecendo, ele tentou salvar, fazer (sua candidatura ao Planalto em 2022), não deu certo (perdeu as prévias para João Doria). Mas eu gosto dele, acho um cara sério.

JC - Pode ser um nome à presidência da República em 2026?

Simon - Acho que ele perdeu a chance. O PSDB estava com os governadores, estava com tudo, um baita partido (em 2022). Agora, o PSDB não existe mais. O presidente do PSDB (Marconi Perillo) está falando em uma fusão... Eu não posso responder (se Leite vai disputar o Planalto) porque não tenho ideia. Entre as hipóteses que vejo, de repente, passar dois anos nos EUA, em uma grande empresa, ficar ali se preparando. É um intelectual.

JC - E para o Senado?

Simon - Tem chances, são duas vagas. Mas não sei, Senado não é o tipo dele. É um cara de (Executivo)... Mas ele tem chance.

JC - Se Eduardo Leite renunciar para disputar Senado ou Planalto, Gabriel Souza assume como governador. Seria o nome natural do MDB ao Piratini?

Simon - Soma muito para ele. Já está no governo do Estado. Agora, não dá para dizer que é ou não é. Isso só lá (em 2026) vamos ver. Tem o Melo, que é prefeito... Não vejo com simpatia o prefeito renunciar, porque tivemos vários casos em que se fez isso e o povo não aceita.

JC - O senhor disse que foi um erro José Fogaça (MDB) ter renunciado à prefeitura em 2010.

Simon - Era prefeito reeleito, fez mais creches do que nos 16 anos do PT (na prefeitura da Capital, 1989-2004) e perdeu (a eleição ao Piratini em 2010). Também o Tarso (Genro, PT) perdeu (a disputa ao Piratini em 2002 após ter renunciado à prefeitura). Quer dizer... O Melo vai fazer uma grande administração e é um nome para o Brasil. Pode ser governador como também, adiante, o presidente da República.

JC - É o maior quadro do MDB no Rio Grande do Sul hoje?

Simon - É o grande quadro. Prefeito reeleito, tem todas as condições. E o Gabriel é um bom rapaz, está fazendo um bom trabalho. Então, quem tem dois quadros, tem que somar, e não diminuir. Um mais um, igual a dois! Um menos um, igual zero!

JC - Entendimento...

Simon - Aí vai ter lugar. Um mais um, um vai para cá, o outro pra lá... Um menos um, igual zero, os dois vão para a casa.

JC - Um consenso...

Simon - Isso, vamos acertar.

JC - O senhor teve participação na escolha do candidato nas eleições desde a redemocratização, deu a linha do partido. Quem o senhor vê no futuro como líder do MDB no Estado?

Simon - Melo é um nome. Fogaça é um nome. O (ex-governador José Ivo) Sartori... Agora, temos que nos preparar. Eu, com 95 anos, tenho a capacidade de entender o meu lugar: meu lugar é ficar em casa. Pelo amor de Deus, já fiz a loucura de pegar a presidência do partido, era um gurizinho e saí um velhinho que não aguentava mais... Então, temos que fazer um belo trabalho aqui, fazer um chamamento. Caxias não tem um vereador (do MDB). Pelotas não tem um vereador (do MDB). Santa Maria tem um vereador (são dois). Nossas escolhas (formação de nominatas para concorrer nas eleições) para vereador, deputado, eram uma briga. Porque 20 (nomes que queriam ser candidatos) ficavam fora. Hoje, sobram 20 vagas para deputado estadual, deputado federal. Então, vamos recompor.

JC - Chamar novos quadros.

Simon - Lá atrás, fomos buscar o (Nelson) Jobim em Santa Maria, da OAB; o (Luís Roberto) Ponte, da Federação das Indústrias (Fiergs); o (Sérgio) Zambiasi (radialista), tive uma briga para ele ser candidato; o Fogaça era intelectual, foi candidato; o Ibsen Pinheiro, era comunista, ele disse: "Fiquei 10 anos na política... Agora que eu estou numa boa, vou pegar esse negócio". E foi... Então, fomos buscar os caras. Nessa última (eleição), quem quis, quis; quem não quis, não quis.

JC - É um desafio do MDB?

Simon - Precisamos ter uma equipe. Volto a dizer, eu em casa posso ajudar, sentar em uma mesa, fazer parte do diretório estadual. Agora, temos que pegar pessoas que tenham garra de fazer. Fui governador e tínhamos 19 deputados (na bancada federal gaúcha). Hoje temos três. E eram 27 deputados estaduais, hoje temos seis (no MDB). Temos que refazer esse partido.

JC - E o MDB nacional?

Simon - Tem que bolar alguma coisa, como o Iepes, com plano de entendimento para o Brasil. É hora de recompor o Brasil. Temos que dar a nossa contribuição.

JC - Pela oposição, entre Jair Bolsonaro e o candidato que ele apoiar, quem vai?

Simon - Bolsonaro já teve a vez dele. Podia ir ao Senado. Dos políticos que estão aí, vejo em destaque o governador de São Paulo (Tarcísio de Freitas). Impressionante, ele fala na televisão horas e não tem um papel na frente, fala números, dados. Acho um bom nome. E acho que o Lula não vai querer ir à reeleição. Vai fazer 80 anos...

JC - E quem seria o candidato a sucessor dele?

Simon - Não sei... Gosto do ministro da Fazenda, um cara sério, competente, foi bom prefeito (de São Paulo), um baita ministro da Educação. E é um bom ministro da Fazenda, sereno, bom diálogo com as oposições. O Lula se mete nisso e naquilo, mas ele dialoga, se dá bem com o Lula. E teve um bom diálogo com o presidente do Banco Central (Roberto Campos Neto).

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